domingo, 2 de fevereiro de 2020

Desaprender

Queila Andrade Haine Campos
(Graduanda de Psicologia - Univasf. 
Disciplina Educação e Políticas Públicas.
Prof. Marcelo Ribeiro)


Algo mágico acontece aos vintes e cinco anos, perspectivas e as prioridades mudam, não sei, tenho a impressão que isso chegou cedo pra mim, esperava que viesse lá pelos 30. Sinto que cheguei na fase Rubem Alves, de Desaprender. “[...] desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram. Desencaixotar emoções, recuperar sentidos”. E como se a escola e as universidades tivessem se perdido em sua missão. Não falamos sobre isso na sala de aula e nem precisamos recorrer aos índices do Pisa (2018), INEP... para perceber que há tempos a escola deixou de explorar o desejo de conhecer. 
 Passamos em média 14 anos na escola, somado uns cinco na graduação e caso queira prosseguir na academia, vão-se anos em mestrado e doutorado. Fato que passamos boa parte de nossa vida na escola e universidade e talvez nem 10% desses saberes realmente nos acompanhem. Para além de culpar professores, alunos e gestores precisamos repensar a quem realmente a escola está a serviço, pois apesar de sua inegável importância tem sido tratada como secundária, um exemplo é a aprovação da Proposta da Emenda Constitucional (PEC) 241 que limitou os gastos públicos pelos próximos 20 anos. (Agência Senado, 2018)
Contudo, fazer uma retrospectiva da educação brasileira principalmente no contexto econômico pode nos ajudar a compreender o processo de falência das escolas, considerando alguns acontecimentos históricos e suas implicações na conjuntura atual. Uma vez que, a educação pública há tempos sofre cortes orçamentários, os quais segundo Dusek (2019) tem contribuído para evasão e má formação do aluno e tem impactado no alcance de direitos, aumento das desigualdades sociais e também na construção da cidadania.
         Voltando até o fim da segunda grande guerra, por volta de 1945, com a vitória dos aliados, o Brasil passou por um intenso processo de modernização que provocou mudanças em vários setores da sociedade, em especial, devido a influência do Keynesianismo cuja proposta é a ampliação dos gastos públicos objetivando aquecer o setor privado (Morais, 2014 citado por Dusek, 2019). Juscelino  Kubitschek  (1956-1960) abraçou as concepções keynesianas focou em produção, em acúmulo de capital e seu plano desenvolvimentista composto de cinco eixos. Todavia, “apenas 3,4% das verbas foram previstas para e educação, enquanto 93% de recursos foram destinados à energia, transporte e indústria de base” (Strassburg, 2015, p. 27, citado por Dusek, 2019). Já começamos a perceber como a educação foi menosprezada e que a ausência desse financiamento levou a consequências a longo prazo.
         Pulando para a Ditadura Militar que começou em 1964, nesta houve inúmeros retrocessos muito custosos aos brasileiros, como a supressão de direitos civis, políticos e sociais. Obviamente, esse rompimento com a democracia repercutiu nas escolas e universidades, as quais tiveram sua autonomia reduzida, conteúdos alterados e desigualdades corroboradas (Dusek, 2019). Nesse contexto, as políticas públicas educacionais estavam a serviço dos grupos que apoiaram o golpe militar, promovendo a rápida expansão do ensino privado. (Cunha, 2014, p. 363, citado por Dusek, 2019).
         Chegando na contemporaneidade, a educação continua não sendo uma prioridade para os governantes, ainda mais devido a vigência da ideologia econômica neoliberal. Entretanto, é importante ressaltar que apenas o investimento financeiro não será a solução de todos nossos problemas, mas o comprometimento desse setor, impacta, reforçando as desigualdades sociais, com mais veemência o pobre que sofre com o sucateamento das instituições de ensino.
         O que faremos com todos esses números e fatos? Penso que é urgencial a “democratização da vida nas escolas”, o poder precisa ser diluído por toda comunidade escolar. Rubem Alves (2011) sugere que comecemos de fato a escutar as crianças e adolescente e que eles realmente sejam levados a sério nas tomadas de decisões na escola. Há tanta pressa em se memorizar o máximo de conteúdo que puder, passar no vestibular (Enem), passar em um concurso; como todos entraram no ritmo frenético das máquinas, ninguém quer ficar pra trás e as linhas de chegada vão ficando cada vez mais inatingíveis, porque falta o deleite do caminho e dos dias comuns. Nesse sentido, é preciso que a escola “gaste” mais tempo se interessando por seus alunos, por seus sonhos, medos, alegrias do que em cumprir um programa. A gente precisa reaprender a pedagogia do encanto e, cá entre nós, suspeito que acontece “Devagar.  Por  causa  do  prazer.  O  prazer  anda  devagar.” (Alves, 2011, p.63). 


Agência Senado. (2018).Promulgada Emenda Constitucional do Teto de Gastos Públicos. Disponível em:https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/15/promulgada-emenda-constitucional-do-teto-de-gastos  Acessado em 25/01/2020

Alves, R. (2011). A pedagogia dos caracóis. Verus editora.

Dusek, P. M., & Avelar, K. E. S. (2019). A trajetória da educação brasileira no contexto econômico. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação-Periódico científico editado pela ANPAE35(2), 369.

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