quinta-feira, 18 de junho de 2015

DIFERENÇAS CULTURAIS NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS: JEITO BRASILEIRO E CANADENSE DE EDUCAR

Eu tive a alegria de passar alguns dias na companhia de amigos canadenses, um casal com sua simpatissíma filha de três anos. Foram dias para matar as saudades e também para discutir e organizar projetos em comum. Afinal, compartilhamos da mesma vida profissional, que é a universidade.

Entre um papo e outro falávamos das diferenças culturais dos nossos países, mas sobretudo do jeito de educarmos os filhos. Longe de buscarmos generalizações, intencionávamos apreender um jeito comum do brasileiro e do canadense educar seus crianças. Entre uma conversa e outra lembrei de algumas cenas de crianças, sobretudo quando da minha estada no Canadá.

Lembrei, por exemplo, que era comum encontrar um monte de crianças circulando nas ruas. Estas, certamente em alguma atividade escolar, ficavam segurando uma espécie de corda (algo como uma centopeia, onde cada criança segurava uma perninha) e sendo guiada pela professora. Eu ficava admirando aquela cena, onde as crianças caminhavam de maneira comportada. Ficava imaginando tal situação no Brasil. Pelo menos o Brasil que eu conheço as professoras teriam um certo trabalho para manter a ordem da fila e a disciplina das crianças.

Comentava com os meus amigos que no Brasil tendemos a nos relacionar de maneira mais dengosa com os nossos filhos, tendo um cuidado e atenção que beiraria a proteção demasiada. Sinto que nós brasileiros, dizia para eles, nos “derretemos” muito com as crianças, sentimos até pena por vê-las se debulhando com algo. Não nos contemos com o nosso sentimento de pegar, apertar, de fazer “bilulu” e terminamos por fazer por ales aquilo que elas, talvez, pudessem fazer sozinhas.

Dizia ainda que os via todo o tempo incentivando os filhos a fazer por eles mesmo e uma frase muito comum era: “tu es capable” (esse casal era do Québec, o lado francês do Canada). Isso nos remeteu a refletirmos sobre a questão da autonomia e como esta tem a ver com a disciplina e com a questão dos limites. Realmente, não há como conceber a autonomia sem relacionar com o limite. Assim, uma educação voltada para autonomia implica, necessariamente, em uma educação onde a criança lida melhor com os limites e, consequentemente, com a disciplina.

Resgatando alguns princípios piagetianos sobre o conceito de autonomia (sobre desenvolvimento moral) este se dá de maneira mais favorável quando a criança é exposta a um contexto de diálogo e também de responsabilização por seus atos. Tal contexto ajudaria a criança situar suas relações com os outros e compreenderia melhor as regras sociais.

Mas voltando a história com os meus amigos, houve um dia que fomos a praia. Além da oportunidade de brincar na areia e na água com a filhinha deles, vivemos uma situação que recuperou o nosso papo sobre educação. Quando estávamos a sair da praia, fomos lavar os pés em um chuveiro (desses que ficam instaladas ao lado das barracas de praia) para tirar o excesso de areia. Quando chegou a vez da menininha, esta pediu ajuda dizendo que não conseguia esticar seus pezinhos até encontrar a água. Novamente veio a fala dos pais: “tu es capable”. Então ela se esforçou mais um pouquinho e conseguiu. Eu tive que me conter, pois estava quase pegando a coitadinha e ajudando ela a lavar os pés (repararam meus diminutivos?!).

Não quero dizer que os meus amigos são frios ou negligentes com a filha,. Totalmente longe disso. Ao contrário mesmo. Eles são muito afetuosos e cuidadosos com a filha. O tempo todo eles se beijam, se tocam e trocam palavras de carinho. Também não quero dizer que há um jeito cultural mais certo de educar do que outro (até porque pensar genericamente é muito perigoso). Nossa conversação versava sobre as diferenças culturais nos processos educativos e como isto parecia ter repercussões na aprendizagem e no desenvolvimento das crianças. É certo que a fronteira entre excesso de autonomia e negligência pode ser tênue, ou do excesso de cuidado e proteção pode prejudicar as crianças. Essas situações extremas não correspondem aos modos culturais de se educar. Além disso há toda a questão de que as culturas produzem sentidos relativos aos seus próprios mundos. Ademais, essas diferenças culturais nos ajudam a refletir sobre nós mesmos, principalmente, aqui em questão, sobre o nosso jeito de educar as crianças.


Por Marcelo Ribeiro. 

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