sábado, 30 de março de 2019

PSICOLOGIA EM EMERGÊNCIA E DO DESASTRE É TAMBÉM DA ORDEM POLÍTICA






Quando ouvimos falar de situações de emergências e desastres, normalmente nos vem à cena a própria tragédia e o sofrimento, e isso, por sua vez, nos faz pensar em gestos de socorro e acolhimento. Contudo é importante não perder de vista que as situações de emergências e desastres, principalmente para a Psicologia, sempre são atravessadas por dimensões políticas, sejam condições prévias, no ato e processo da intervenção ou em condições posteriores.

Assim, citarei três casos para ilustrar essas dimensões políticas. O último será emblemático.

No caso da boate kiss(Santa Maria – RG) parece ter havido um problema de fiscalização e ou descumprimento das condições e normas de funcionamento da boate. Isso remente a política de efetivação das legislações vigentes, mas também a capacidade do estado e sociedade civil em dar respostas imediatas aos diretamente envolvidos, sobretudo. Além disso, e partir daí, um necessário fortalecimento nas fiscalizações em ambientes fechados e de aglomerações de pessoas se fez/se faz necessário.

A tragédia na Mina do Feijão, da Vale, em Brumadinho, também está atravessada por dimensões políticas nos três níveis: um antes, por conta de uma fragilidade e possível irresponsabilidade em não buscar respostas mais seguras às condições da barragem (e toda uma estrutura de fiscalização provavelmente comprometida, inclusive com possível participação do governo); no epicentro da situação; e no pós acontecimento, seja na reparação dos danos, na recuperação das áreas degradadas e nos impactos sociais, econômicos, ambientais, etc. 

O terceiro caso é emblemático e visa ser o foco dessa articulação entre situações de emergências e desastre com a dimensão política, que é o caso de Maceió. Os bairros de Pinheiro, Mutange e Bebedouro estão sob grave impacto ocasionado por fenômenos sísmicos, provocando rachaduras em ruas e imóveis, além de aberturas de crateras. Há reais preocupações que os bairros possam afundar a tal ponto que o prefeito, Rui Palmeira, comunicou, no dia 23 de março (2019) ao Ministério Público do Estado, que decretará calamidade pública. 


Esse acontecimento não tem precedentes na história do país e pode tomar proporções inimagináveis em termos dos impactos os mais variados possíveis. Afinal são bairros centrais, abrigando milhares de pessoas, numa capital brasileira. 

Esta situação malograda que ocorre na capital alagoana demanda ações diversas de vários setores, mas há uma importante contribuição da Psicologia nesse caso, que é, além do acolhimento às pessoas e às famílias que sofrem duramente esses impactos, há que contribuir com o fortalecimento político das comunidades envolvidas. Afinal, há e haverá tensões no que diz respeito as indenizações, a defesa dos direitos e também no processo de participação e acompanhamento em relação as ações de desocupação, realocações e criação de novas condições dignas de vida. 

Psicologia em Emergências e Desastres é também da ordem política!


Marcelo Silva de Souza Ribeiro
Professor da Univasf e psicólogo 


sábado, 23 de março de 2019

Manifestação, política, formação e encontros




Marcelo Silva de Souza Ribeiro


Petrolina. Nessa última manifestação do dia 22 de março de 2019, contra a proposta do governo a respeito da reforma da previdência social, pude experimentar o sentido educativo do ato político. Entre conversas com colegas e observações diversas muitas experiências enriquecedoras se fizeram presentes. Uma manifestação política como essa é muito mais que um simples ato carregado de palavras de ordem. Na verdade, é um palco onde atos políticos educativos se transbordam nas convivências, tensões, divergências e dialogicidades encontradas. É um estar de coração aberto aos acontecimentos inusitados e surpresas formativas. É encanto do belo. É o encontro provocante.
Lá, dentre tanta gente querida, reencontrei o saudoso colega Herlon, também professor (professor do Instituto Federal do Sertão Pernambucano), em meio ao povo. De cabelos curtos e cristalinos, quase que não o reconheci. E logo estávamos numa roda de conversa, envoltos de tantas outras pessoas. Entre algumas falas, logo apareceu um político local que havia votado a favor do impeachment para a presidenta Dilma, mas que naquele momento se colocava contra a proposta da reforma da previdência. Entre nós uma discussão foi iniciada a respeito da importância dessa adesão, mas também da necessidade de não esquecermos a opção tomada pelo político (em relação ao apoio do impeachment ). Essa discussão ganhou entusiasmos e novas reflexões foram produzidas quanto as responsabilidades do ser público e do ser privado (pessoal), das estratégias em se formar uma frente e valorizar as adesões de antigos oponentes, mas também de saber dar “a dose certa” da crítica....
Nesse meio tempo todos foram surpreendidos quando um dos mediadores do ato apontou para três pessoas, denunciando-as como sendo do Movimento Brasil Livre (MBL) e que estariam ali a provocar. Quase todos se vivaram para os três indivíduos que, de fato, exibiam símbolos de posições políticas antagônicas (um deles tinha um boné com a bandeira dos E.U.A.) e faziam algum tipo de provocação (um outro ficava com o celular a gravar tudo – possivelmente para algum tipo de edição que serviria aos seus propósitos políticos). 
Entre nós, da roda de conversa, passamos para uma nova e provocante discussão: até que ponto é razoável tolerar a presença ativa de grupos de ultradireita em manifestações como aquelas? Qual o limite da democracia que traz a premissa de respeitar o diferente? E se fosse o contrário? Estaríamos sendo permissivos e, de alguma maneira, alimentando futuros “monstros que irão nos engolir” no futuro?
Após algumas falas no ato da Praça do Bambuzinho, a manifestação ganhou as ruas e seguimos na passeata. Como eu estava de bike, fui empurrando a “magrela” ao lado do meu parceiro de universidade, Alexandre Barreto. Caminhávamos mais lentamente, lá bem no fundão. Nossas conversas fluíam ao compasso dos protestos e nos davam ânimos a encarar o calor escaldante das 11h. 
Dois alunos de Ciências Sociais (coincidentemente filhos de um querido, Jota Menezes) se juntaram aos nossos passos cadentes. Nossas conversas versavam sobre a tentativa de entendermos os fenômenos dos massacres (referíamo-nos, particularmente, ao massacre ocorrido numa escola em Suzano), da emergência de pessoas com pensamento de extrema direita e como esses fenômenos tinham a ver, pelo menos no que diz respeito aos contextos forjadores, com um mundo utilitarista, coisificante, fálico e mediado pela violência. Tentávamos uma análise pela via da chamada Psicologia Política e Reich foi um interlocutor importante nas nossas conversações. Tínhamos um entendimento de como nossa sociedade é estruturada (e controlada) pela via do medo e da insegurança e como esta emoção é a base da violência, sendo, portanto, terreno fértil para posições políticas autoritárias, reacionárias, intolerantes e fascistas.
Chegamos até o ponto final da manifestação, que foi o INSS. Nessa altura, os estudantes que nos acompanhavam tinham feito outros agrupamentos. Despedi-me de Alexandre e ainda por alguns instantes apreciei aquela “mani-fest-ação”. Tomei consciência do quão rica e formativa foi para mim e, possivelmente, para todos. 
A beleza daquela sexta-feira ensolarada reservara surpresas, poesia e beleza. Afinal, o fazer político e o viver a polis é da ordem educativa quando o coração é entregue...




quarta-feira, 20 de março de 2019

ANÁLISE DO SISTEMA DE COTAS COMO INSTRUMENTO DE COMPENSAÇÃO DE VULNERABILIDADE




Rebeca Cavalcanti Nunes Amorim[1]
                        
A partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 1988), o sentido de igualdade, antes baseado na ideia de que as normas deveriam ser aplicadas da mesma forma para toda a população – fosse rico ou pobre, branco ou preto, do Nordeste ou Sudeste – transformou-se na ideia de igualdade material. Esse novo princípio pressupõe 
“(...) uma igualdade proporcional porque não se pode tratar igualmente situações provenientes de fatos desiguais. O raciocínio que orienta a compreensão do princípio da isonomia tem sentido objetivo: aquinhoar igualmente os iguais e desigualmente as situações desiguais” (BULOS, 2008, p. 79 apud MELERO, MARTINS, JUNKES & ROSSI, 2017).
Por muito tempo, o acesso à universidade federal foi privilégio de jovens provenientes das classes média e alta que, de modo geral, concluíram a educação básica em instituições privadas. Desse modo, a visão elitista acerca do ensino superior no Brasil reafirma as desigualdades sociais historicamente impostas (MELERO, MARTINS, JUNKES & ROSSI, 2017). De encontro a essa ótica, aLei Nº 12.711, promulgada em 29 de agosto de 2012,prevêa implantação da política de cotas, que reserva vagas em instituições federais de ensino superior para estudantes egressos de escolas públicas (BRASIL, 2012).  A lei tem por objetivo proporcionar ao cidadão em estado de vulnerabilidade social, econômica e histórica as condições necessárias para que alcance, de fato, a igualdade em meio às desigualdades construídas em sociedade.
Nessa perspectiva, a Lei Nº 12.711determina que 50% das vagas ofertadas pelas universidades federais e Institutos Federais de Ciência e Tecnologia devem ser destinadas a alunos que tenham cursado integralmente o ensino médio público.Dentro dessa porcentagem, metade das vagas são atribuídas a estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a um salário mínimo e meio per capita. Além disso, as vagas reservadas a afrodescendentes, indígenas e seus descendentes – cotas étnicas – também estão inseridas nesse percentual, devendo ser distribuídas de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (BRASIL,2012).
Nesse sentido, tal ação governamental pode ser considerada um importante marco na história da educação de nível superior do Brasil, tendo em vista que possibilita o acesso das camadas sociais menos favorecidas a essa categoria de ensino.Isso se tornou possível a partir da expansão do ensino superior entre 2003 e 2015, que proporcionou a criação de novas universidades federais, bem como a construção de novos campiuniversitários e de Institutos Federais de Ciência e Tecnologia. Desse modo, houve também o aumento na quantidade de estudantes que ingressam o ensino superior federal, que passaram de 100 mil para 230 mil anualmente. Esses dados vão de encontro ao mito de que a política de cotas prejudica os não cotistas, tendo em vista que, mesmo com metade das vagas sendo destinadas às cotas, houve o aumento de 15 mil vagas para ampla concorrência (RIBEIRO, 2018). 
Muitos dos posicionamentos contrários à política de cotas se mostram como formas de conservar a estrutura de segregação e opressão social. Tendo em vista que o conhecimento é ferramenta essencial para a detenção de poder, não interessa à elite opressora proporcionar o acesso das camadas menos favorecidas à educação. Como justificativa à desigualdade de oportunidades, os opressores perpetuam o discurso de que conquistaram sua posição e direitos sociais com seu próprio esforço, sendo os oprimidos considerados “invejosos” que não os tem por serem “incapazes e preguiçosos” (FREIRE, 1987).
Para Freire (1987), superar a relação de opressão “implica no reconhecimento crítico, na ‘razão dessa situação’, para que, através de uma ação transformadora que incida sobre ela, se instaure uma outra, que possibilite a busca do ser mais”. Nessa perspectiva, a lei de cotas pode ser entendida como uma ação transformadora que possibilitará o acesso à educação que, por sua vez, é uma prática de libertação.
Dessa forma, indo de encontro à lógica de opressão, a lei Nº 12.711 prevê a redução das diferenças sociais, permitindo que a parcela da população historicamente menos privilegiadas possa, de fato, concorrer de forma mais igual às vagas nas universidades federais no Brasil. Assim, a lei de cotas não se caracteriza como uma política protecionista, mas como um mecanismo de inclusão social por meio da educação.

Referências
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: . Acesso em: 10 mar. 2019

BRASIL. Lei 12711/2012. Disponível em . Acesso em: 10 mar. 2019

MELERO, C.; MARTINS, C. B.; JUNKES, D. & ROSSI, E. A Lei Nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, como política que favorece a busca da igualdade material.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, 42.ª edição.

KRAWCZYK, N. Escola pública: tempos difíceis, mas não impossíveis. Uberlândia, MG: Navegando, 2018.


[1]Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas (2018.2), da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).

PANORAMA DA PEDAGOGIA WALDORF NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA



                                                                                        
                                                                                                            Lorena Francisca de Oliveira[1]

            A educação no Brasil sofre os efeitos da herança histórica de desigualdades, da lógica dominante de mercado e da recente mudança no panorama de governo. Diante disso se faz necessário a busca de recursos alterativos que minimizem esses sintomas e que contra-argumentem com o discurso bancário (FREIRE, 2005), meritocrático e normativo de ensino, não só no aspecto macro, por meio das políticas públicas, mas também das micropolíticas dos contextos escolares. Um modo de fazer isso é através de projetos e metodologias pedagógicas comprometidas com outros modos de educar, uma delas e sobre a qual será tratado nesse ensaio, é a pedagogia Waldorf, um modelo pedagógico que propõe uma perspectiva mais abrangente de contato consigo e com o mundo, na relação ensino-aprendizagem.
            A pedagogia Waldorf surge em 1919, a partir de fundamentos teóricos, de natureza filosófica e antropológica, desenvolvidos pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), responsáveis por uma ampliação na visão de educação e antes de tudo, de ser humano. Tudo começa na cidade de Sttutgart na Alemanha, quando Emil Molt, um entusiasta das ideias de Steiner e dono da fábrica de cigarros Waldorf-Astória, propõe a ele a criação de uma escola para os filhos dos funcionários da fábrica (ZIEGLER & LIMA, 2018). Desde a criação da primeira escola, houve uma expansão que já conta com mais 100.00 delas no mundo, e 73 só no Brasil, segundo a Sociedade Antroposófica Brasileira e a Federação das Escolas Waldorf do Brasil, respectivamente.
            Ainda segundo Ziegler & Lima (2018), essa proposta é fundada a partir dos pressupostos da Antroposofia, cuja etimologia grega significa conhecimento do ser humano a partir do conhecimento da natureza e do universo. Uma perspectiva teórica elaborada por Steiner, que reúne suas ideias sobre o conhecimento e os modos de se chegar até ele, pautadas no que chama de filosofia da liberdade, pois, para ele, a liberdade é um “processo de autodeterminação da consciência, à atividade pensante”. Trata-se de uma proposta de resgate à autonomia, de experimentação do mundo e da própria vontade de conhecê-lo, de tal modo que seja dispensada a exigência externa de aquisição de conteúdos e de desenvolvimento de habilidade, e colocada em seu lugar a autônoma compreensão cognitiva dos fenômenos. (BACK JUNIOR, 2013)
            O ideal de liberdade da pedagogia Waldorf dialoga com aquela defendida por Paulo Freire, pois apesar de abordarem diferentes aspectos, a libertação da opressão em Freire e a individualidade em Steiner, ambos partem dos princípios de uma educação libertadora, com incentivo ao desenvolvimento de autonomia nos processos educativos (BACK JUNIOR, 2012). Na contrapartida, de acordo com Monteiro, Castro e Herneck (2018), a última publicação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), sobre a educação infantil, apesar de apontar para direitos e objetivos de aprendizagem por meio de uma aplicação e avaliação processual, não apresenta condições para transpô-los à realidade das crianças, pois desconsidera os dilemas contextuais das escolas, as singularidades dos alunos, e a necessidade de potencializar as relações professor-aluno, professor-família, como corresponsáveis pelo processo de ensino-aprendizagem. Desse modo, a pedagogia Waldorf se propõe a preencher essas lacunas que o modelo pedagógico tradicional não tem conseguido superar.
            Segundo Barz e Randoll (2015), na europa, as escolas orientadas pela pedagogia steineriana, são consideradas escolas para a elite, uma alternativa às escolas públicas, pois não contam com financiamento completo do governo, e em específico, na Alemanha que possui mais de 200 dessas instituições, a proporção de pais com formação acadêmica é alta. No Brasil, uma pesquisa realizada com 11 dessas escolas do Sul e Sudeste do país (AZEVEDO & MARCONDES, 2016), avaliou o perfil das famílias dos alunos, e concluiu que o nível socioeconômico dos pais é predominantemente médio ou alto, e os valores cobrados pelas escolas que variam conforme o nível de ensino, tem valores que podem chegar a 1.350,00 para a educação infantil e 2.800,00 para o ensino médio, Semelhante ao estudo anterior, a maioria dos pais também tem ensino superior.
            Apesar da predominância apresentada da rede privada nas escolas Waldorf, no Brasil há iniciativas que fomentam a expansão do modelo também para famílias menos favorecidas socioeconomocamente, em especial para a rede pública de ensino. Uma delas é o Programa Escolas Transformadoras, mantida por uma organização internacional de empreendedores sociais de diferentes países, que em parceria com uma organização sem fins lucrativos brasileira, financia no país escolas steinerianas e de outras pedagogias alternativas. Nesse sentido, há também a atuação do Instituto Ruth Salles que incentiva a criação dessas instituições, especialmente na rede pública, através de divulgação da pedagogia e de assessoria à organizações e governos, e que atualmente idealiza uma pesquisa sobre a implementação das escolas Waldorf públicas que já funcionam no país, como forma de divulgar e incentivar a criação de novas escolas públicas com esse perfil.
            Desse modo, no centenário da pedagogia Waldorf no mundo, os desafios para a sua expansão no Brasil, em especial no sistema público de educação, apontando para a necessidade de mais pesquisas na área e apoio às iniciativas organizacionais que sustentam o modelo em instituições brasileiras. Modelos como esses representam uma tentativa de superar dificuldades da educação que atravessam gerações e não têm apresentado perspectivas de avanço dentro da pedagogia tradicional. Sendo assim, enquanto houverem brechas a educação libertária se fará presente, em busca de um desenvolvimento que vá além da transmissão de normas e conteúdos.


Referências:

AZEVEDO, L. M.; MARCONDES, F. O perfil das famílias que optam pela Educação Waldorf no Brasil, Paraná, 2016.

BACK JUNIOR, J.; STOLTZ, T.; VEIGA, M. Autoeducação e liberdade na Pedagogia Waldorf. Educação: Teoria e Prática, Rio Claro, v. 23, n.42, p. 161-175, jan/abr. 2013.

BACK JUNIOR, J. A Pedagogia Waldorf como educação para a liberdade: reflexões a partir de um possível diálogo entre Paulo Freire e Rudolf Steiner. 2012. 409 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012.


Federação das Escolas Waldorf no Brasil. Disponível em:<http://www.fewb.org.br/Links-Uteis.php>. Acesso em 10 de Março de 2019

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, 42.ª edição.

Instituto Ruth Salles:<http://www.institutoruthsalles.com.br/pedagogia-waldorf-na-rede-publica/> Acesso em 10 de Março de 2019

MONTEIRO, C. C.; CASTRO, L. O.; HERNEK, H. R. O silenciamento da educação infantil: proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Pedagogia em Ação, Belo Horizonte, v. 10, n. 1, set. 2018.

RANDOLL, D.; PETERS, J. Pesquisa empírica sobre a pedagogia Waldorf. Educar em Revista, Curitiba, n. 56, jun. 2015

Sociedade Antroposófica Brasileira:<http://www.sab.org.br/portal/> Acesso de 10 Março de 2019

ZIEGLER,S. S.;LIMA,G. F. C. Contribuições da Pedagogia Waldorf para uma educação ambiental crítica: o processo pedagógico na Escola Waldorf Rural Dendê da Serra em Uruçuca-BA. Rev. Eletrônica Mestr. Educ. Ambient, Rio Grande, v. 35, n. 1, p. 296-314, jan./abr. 2018.







[1]Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas (2018.2), da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).

Políticas públicas brasileiras: um retrato da realidade


Edyenele Freire Guimarães[1]


Fazendo um panorama da educação brasileira nos últimos tempos é possível observar o esforço construído em prol da superação do quadro de analfabetismo que afligiu o Brasil. Juntamente com o processo de redemocratização, tivemos o desenvolvimento de pesquisas na área educacional que demarcaram a ocorrência de altos índices de defasagem escolar, escancarando ainda a desigualdade regional que coloca as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste com os piores índices educacionais do país.
No ano de 1996, diante das acaloradas discussões políticas foi promulgada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), representando um avanço significativo quanto a definição do papel do Estado e suas atribuições. A partir disso, surgiram também os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) que ditaram as diretrizes para o ensino, formação de professores e educação especial nas escolas. 
Dessa forma, a escolarização passou a ser um direito de todos os brasileiros, compreendendo do ensino infantil ao médio, garantindo investimentos e expandindo o número de vagas ofertadas como formas de alcançar a universalização do ensino público, gratuito e de qualidade. É possível afirmar que a vigência de políticas públicas na área permitiu avanços importantes quanto ao acesso, no entanto é preciso um olhar crítico para soluções que se apresentam simplistas.
Um primeiro ponto a se destacar é a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB, enquanto um equalizador que diminui as desigualdades existentes, atendendo a demandas regionais através de recursos complementares. No entanto há ainda uma carência em conhecer a realidade que se pretende mudar durante a formulação das políticas públicas educacionais para as quais esses recursos são destinados.
 As barreiras culturais, sociais e econômicas por vezes são desconsideradas como coloca Goldember (1993), dando as políticas um caráter utópico. O profissional que está exposto diariamente a esses contextos tem participação restrita, geralmente na sua implementação, sendo sujeitado a práticas que não correspondem a realidade local. 
Um exemplo disso são as escolas de lata, geralmente localizadas em comunidades rurais e periferias, sendo utilizadas como estratégias de prefeituras que alegando não possuir recursos para reformar e construir novas escolas, alugam contêineres para substituir as salas de aula convencionais. Essas estruturas apresentam ainda condições precárias de funcionamento, feitas de material inflamável, sem proteção térmica e ventilação. 
Situações como essa nos levam a um segundo questionamento acerca da qualidade da educação brasileira e dos péssimos níveis de desempenho registrados. Em uma palestra realizada para membros do conselho técnico da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviço e Turismo pelo presidente do Banco do Brasil, Rubens Novaes, o economista afirma que a má colocação do Brasil em rankings internacionais de educação se devem as crianças brasileiras vindas de famílias pobres e não a problemas do sistema de ensino no país. O mesmo afirma ainda que devido a desnutrição e a má formação neuronal as crianças já chegam a escola com problemas cerebrais que tornariam quase impossível o alcance de um desempenho satisfatório.
 No entanto, essas crianças, tidas como problemas no sistema educacional devido ao fracasso escolar, aprendem a viver fora dele em condições de muita dificuldade, sendo capazes inclusive de prover o seu sustento e o de sua família (situação ilegal, porém verdadeira). Como comprova Teresinha Carraher et al (1982) em um estudo realizado com adolescentes brasileiros no qual foi possível verificar que a dificuldade desses jovens na aprendizagem de matemática no ambiente escolar formal não se caracterizava como um desconhecimento das operações matemáticas uma vez que estes jovens conseguiam reproduzi-las de maneira informal no seu cotidiano de maneira assertiva.
Dessa forma podemos identificar que há uma falha que culpabiliza o aluno, especialmente na rede pública de ensino, e sua condição histórica, existindo uma isenção do papel da escola que, diante de tantas alternativas pedagógicas e metodológicas continua a apresentar um currículo inadequado e falho que não consegue chegar para essa população.  
Outra reflexão a ser feita é: quais os objetivos da educação fornecida no nosso país? A que/quem serve o nosso sistema educacional? Para sujeitos que estão mais próximos a linha da pobreza a educação surge como refúgio, sendo o seu meio de ascender socialmente e obter maior qualidade de vida. Para a sociedade em si é esperado que o ambiente escolar seja o local para desenvolvimento da cidadania, mas há ainda uma lógica perversa que molda estes sujeitos a partir de uma ótica mercadológica como mão-de-obra, focando na sua produtividade e utilidade política e econômica.
O atual ministro da educação, Ricardo Vélez Rodríguez,eleito pelo governo Bolsonaro, em uma de suas declarações afirmou que a educação no ensino superior deverá se restringir a uma elite intelectual, diferenciando-a ainda da elite econômica do país. Ora, quem fará parte desta elite se antes mesmo de chegar ao nível superior estes jovens, vulgo futuro do país, já foram excluídos do processo educacional mais básico?
É possível visualizar que existe no Brasil duas tendências quanto a formação, a primeira voltada para o nível superior e caracterizada por indivíduos das classes médias e superiores, e a formação técnica profissionalizante que absorve as classes trabalhadoras, constituindo a mão de obra do país. O discurso do ministro não só escancara essa realidade como a mantém. 
            Assim, os discursos aqui apresentados revelam a realidade de uma país elitista, marcado pela profunda desigualdade social e guiado por interesses políticos, ao passo que revela os interesses daqueles que atualmente ocupam o poder e mantém esse sistema. Deste modo, muitas das nossas políticas estão voltadas para o que Paulo Freire (1998) aponta como sendo uma falsa caridade, advinda daqueles que eventualmente estendem as mãos em atos de “generosidade”, mas mantém as condições de injustiça.
            Nesse sentido, a efetivação de políticas realmente funcionais só se dará através da constituição de sujeitos que se apropriem de sua condição enquanto oprimidos, e que estando munidos de uma atuação política libertadora não apenas passem para o outro polo, mas rompam com a dicotomia existente. 

Referências Bibliográficas

Carraher, T. N. et al (1982).Na vida dez, na escola zero: Os contextos culturais da aprendizagem de matemática.Caderno de pesquisa. São Paulo (42): 79-86.
GOLDEMBERG, José (1993) . O repensar da educação no Brasil. Estud. av. São Paulo, v. 7, n. 18, p. 65-137.
CARTA E EDUCAÇÃO – REPORTAGENS Disponível em:  Acesso em 11 de março de 2019.
FOLHA DE SÃO PAULO – MERCADO Disponível em:   Acesso em 11 de março de 2019.
FREIRE, P. (1998). Pedagogia do Oprimido. 25 ª ed. (1ª edición: 1970). Rio de Janeiro: Paz e Terra.



[1]Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas (2018.2), da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).


PEDAGOGIA DO OPRIMIDO, CONCEPÇÃO DA EDUCAÇÃO BANCÁRIA E POLÍTICAS PÚBLICAS COM BASE NA EDUCAÇÃO PROBLEMATIZADORA


Vanessa Melo da Silva[1]

Durante as discursões que houveram em aula, as conversas sobre o livro Pedagogia do Oprimido (Freire, 1998) me chamou a atenção porque é notório suas críticas relacionado a educação, quem já passou pelo ensino fundamental e médio identifica facilmente o que o autor se propõem a passar, falar e refletir. É preciso que discursões como essa saia do meio acadêmico e seja disseminada para as demais pessoas de forma simples e clara, para que possa chegar de um jeito que nos leve a ter uma criticidade em torno do nosso dia a dia.

No segundo capítulo do livro, Paulo Freire mostra a concepção bancária da educação que ainda prevalece na maioria das escolas do Brasil, sendo um sistema que é antigo, pois desde a criação das escolas o intuito era educar, mas não o suficiente para se ter um pensamento mais amplo e de sentido do conhecimento.

Nesse contexto, a relação entre educador-educando é fundamentalmente de um sujeito (narrador) que está caracterizado na figura do professor e objetos depositantes, os ouvintes, caracterizado na figura do aluno. Ou seja, a voz do professor naquela sala é a lei e tudo que ele fala é a verdade e não deve ser questionado. Isso acaba deixando várias possibilidades para trás e petrificando o modo de aprender, acarretando em algo sem vida. 

Com isso as palavras ficam ocas, o modo verbal de transmitir conhecimento acaba sendo alienada e alienante, como o que só saísse da boca do educador fossem apenas ondas sonoras desnecessárias. Sua figura de autoridade vem como forma de medo e não respeito, e consequentemente, sua fala são de coisas retalhadas e desconexas da nossa realidade, como por exemplo, as partes do nosso corpo em biologia, ali parece que é algo distante e na verdade estamos falando de processos que acontecem no nosso próprio corpo. 

Como consequência, o educando é conduzido a uma memorização mecânica do conteúdo, segundo a concepção bancária, são vistos como vasos para serem preenchidos docilmente e de preferência o maior número de coisas possível, o educador que consegue isso é considerado o melhor em sua área. Transformando as palavras em sonoridade e não em sua força transformadora, tornando a educação em um ato de depositar, acarretando em uma noção de que os educadores são os depositários e os educandos os depositantes. 

A única margem de ação dos depositantes é receber, guardar e arquivar, não tendo criatividade, transformação e saber. Ainda tem o pensamento de que o saber é uma doação daqueles que se julgam mais sábios e de conhecer mais, acreditam que o pensamento do outro é mais limitado, não sabem nada. Tal ponto de vista é fundada na ideologia de opressão, uma absolutização da ignorância, que constitui uma alienação da ignorância e se encontra sempre no outro. Desse modo, as posições se mantém sempre fixas e invariáveis, sempre como figura de superioridade, apenas ele sabe desconsiderando a educação e o conhecimento como processo de busca. 

O educador é aquele que sempre sabe, pensa, diz a palavra, disciplina, prescreve sua opção de atuação e escolhe o conteúdo, já o educando, é um mero objeto. Sua visão de homem é que são seres de adaptação e ajustamento, quanto mais esse sistema é colocado, quanto mais se tem o ensino como simples forma de arquivamento, menos vão ser desenvolvidos o pensamento crítico e menos vão ter transformadores do mundo. Minimizando o poder criador, a criticidade, sem uma educação estimulante do pensar autentico, satisfaz os interesses dos opressores e estimula a ingenuidade. 

Para Foucault, o enunciado pode ser transmitido de acordo com interesses ou desejos, ele é sempre relacional, não se tratando de um aparecimento individual ou autoral, mas do jogo de posições que o sujeito pode ocupar. Não é necessário que haja um sujeito consciente que diz algo, e sim um jogo de relações que demarca quem pode falar. (Foucault, 2010).

Os opressores estão mais interessados em implantar um pensamento nas bases para não serem questionados, “é transformar a mentalidade dos oprimidos e não a situação que os oprime” (Freire, 1998). Pois, melhores adaptados a situação, melhor o domínio, implementando uma lógica “seres para o outro” pensando que os oprimidos sempre estiveram “fora de”, no entanto eles sempre estiveram “dentro de” e a solução é que se possa compreender que somos “seres para si”. É perigoso para a educação bancária haver essa conscientização dos educandos, a autenticidade é perigosa. 

O pensamento nessa educação é o homem no mundo, e não do homem com o mundo e com os outros, tornando-os apenas espectadores, recebendo os depósitos que o mundo lhe oferece, como se o homem fosse uma presa que só repete e não recria. Ao educador, cabe disciplinar, encher de conteúdos para imitar o mundo, para que possam ser passivos e adaptados. Quanto mais encaixados, mais vão servir para os opressores. 

Alguns métodos que Paulo Freire questiona são as aulas verbalistas, avaliação do “conhecimento”, critérios de promoção, controle da leitura, distância entre educador e educando e as indicações bibliográficas. Em relação a distância que se tem, o educador não entende que é melhor buscar ser com os outros, consequentemente, evita e até teme se comunicar. Prefere que haja uma sobreposição, isso é uma prática da dominação que transforma os educandos em objetos. 

Os opressores tratam as pessoas como coisas, são movidos pelo desejo de ver a vida sendo encarada como mecânica, gosta do sentimento de posse como forma de controle do pensar e da ação, ajustando as pessoas ao seu mundo, inibindo o poder de criar e atuar. A educação como prática de dominação precisa manter a ingenuidade, para doutrinar e conseguir ter uma acomodação do educando ao mundo da opressão. 

Porque ainda existe? 

Colocando dessa maneira parece ilógico continuar com esse tipo de educação, parece que é obvio que ocorra uma mudança significativa desse sistema, mas a resolução é mais complicada do que parece. Primeiro porque foram anos nessa perspectiva e sempre foi de bom funcionamento para os opressores, que sempre arranjam uma maneira de contornar a situação, e esses mecanismos muitas vezes são guiados por alguma moral ou projetos que fazem parecer ser o bem comum da sociedade. Então algumas pessoas, seja educando ou educador, não percebem que executam a educação bancária. 

Alguns argumentos encontrados para embasar e justificar que esse pensamento de Paulo Freire não se adequa aos princípios da população, são prejudiciais e carregam impressões de que há um autoritarismo, as pessoas que seguem essa linha de pensamento são doutrinadoras. 

Na prática, a coisa funciona assim: o professor 

questiona os alunos sobre o seu dia a dia, apresenta uma explicação ideológica para os problemas e insatisfações relatados, e depois discute com eles o que acharam desse conteúdo. Se os alunos discordarem da explicação, o professor argumenta em favor do seu próprio ponto de vista ideológico. Ao fim do diálogo, o professor conclui que os alunos que ele conseguiu convencer estão agora “conscientes” da sua “verdadeira” condição de oprimidos e explorados pela sociedade de classes. (Filho,2013) 

Essa afirmação carrega a ideia de educação que é rejeitada no livro “Pedagogia do Oprimido”, a figura do professor é de uma autoridade impositiva, apesar de ter uma interação de perguntar como foi o dia, o intuito não era de uma escuta e criação de sentido, era para exercer uma figura de quem 
sabe mais e o aluno não, que ele é um vazo que precisa ser preenchido de acordo com suas vontades. Para entender como isso não faz sentido é importante descobrir o que Pulo Freire está falando sobre a educação problematizadora. 

A Educação Problematizadora 

O educador nessa visão é humanista, é orientado para que juntos, educador e educando, possam chegar ao pensar autêntico, é uma relação de troca, não fazendo sentido ser uma doação, pois cada um tem seu potencial. Para isso, deve ter também uma profunda crença nos homens e seu poder criador, pois o pensar só tem sentido se for uma fonte geradora de ação sobre o mundo. 

Essa intercomunicação gera a interação entre educador e educando de forma que sejam companheiros, em uma relação que o saber passe de um para o outro e vice versa. Dessa forma, estariam trabalhando para um serviço de libertação e não de desumanização e opressão. 

A educação não deve ser um deposito de conteúdos que não geram criação de sentido, é necessário haver a problematização do homem nas suas relações com o mundo, que exista um conhecimento dos saberes em seu sentido amplo e que haja a essência da consciência, que significa ser a intencionalidade. 

Então a educação problematizadora acredita que o indivíduo tem o conhecimento e a capacidade de ser reflexivo, de dialogar com o outro. A educação problematizadora serve à libertação que só será possível através da superação. A primeira vista esses conceitos parecem simples, mas a partir desses pressupostos de diálogo, construção de conhecimento e relação teoria-prática é possível fazer diversas possibilidades de melhorar a educação. 

Políticas públicas 

Dentre as diversas possibilidades de introduzir um pensamento crítico e reflexivo, formar os professores é um passo muito importante. Pensando nisso, quando Paulo Freire dirigiu a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, investiu na formação permanente dos educadores, essa formação é entendida como uma problematização que possibilita a reflexão crítica sobre a prática, que ajuda a compreender as diversas relações e determinações. A formação permanente serviu como princípio para programas, políticas e práticas de formação de educadores, para assumirem compromisso ético e romper com o mito da neutralidade da educação e com a suposta vida harmônica de uma sociedade. Pensando nas possibilidades do futuro ser criado e recriado a partir do coletivo (Saul e Saul, 2016).

Também foi implementado o projeto de transdisciplinaridade, que significa uma construção de uma escola mais participativa e decisiva, sendo o educador capaz de elaborar estratégias para inserir a escola na comunidade. O objetivo é experimentar e vivenciar a realidade cotidiana do aluno, professor e do povo, integrando seus saberes, conhecimento em um trabalho coletivo e solidário, dando mais autonomia a escola e se adequando de forma efetiva a sua própria realidade. Para que isso seja possível é necessário um estudo do cotidiano no local, como é organizado, conhecer a história da comunidade, dos alunos e professores, em seguida problematizar e ter formas de como melhorar (Gadotti, 2003) .

Esses dois programas implementado por Paulo Freire serve de base para possibilidades de atuação e de política pública que podemos realizar. Sempre ficando alerta, todos precisam se ajudar de forma coletiva para que os modos de opressão sejam enfraquecidos. Tais propostas devem ser repassadas de forma clara e que cheguem ao entendimento de todos, para que não se caia no erro e acusações infundadas. 

Considerações finais 

Durante as aulas, foi possível identificar esse poder da intercomunicação, as coisas parecem fluir de maneira mais natural e as reflexões ajudaram a ter bases de criticidade perante alguns sistemas que rodeiam a nossa sociedade. Mas é um trajeto bastante desafiador quando se tem uma sala de aula superlotada e que as condições naquele local são mais precárias, levando a compreender que as estruturas também são um modo de opressão, as condições e o investimento na educação são deixadas de lado justamente por medo que os oprimidos comecem a agir de forma contrária aos seus pensamentos. 

Algumas perguntas ficam no ar, por exemplo, a quem nos referimos como opressores? Como conseguiram fazer com que as pessoas seguissem seus discursos? Todas as escolas são assim? 
Esses e outros pontos são importantes e necessários para uma reflexão do nosso contexto, mas são profundos e mais extensos a nível de discursão, teria que achar os arquivos e especificar em recortes, pois não é uma coisa que nasceu de um dia para o outro, são pequenas ações que em conjunto formam tais problemas. Falar sobre não é o intuito desse ensaio, mas questões de extrema relevância para um melhor conhecimento e criticidade que Paulo Freire defende.

Referências

FILHO, Luis Lopes Diniz. (2013). Paulo Freire e a “educação bancária” ideologizada. Copyright © 2019, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados. Leia mais em:https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/paulo-freire-e-a-educacao-bancaria- ideologizada-1m9so0wm12r2m2wau4ghfvedh/ 
FOUCAULT, M. (2010). A Arqueologia do Saber. Tradução Luiz Felipe Baeta Neves. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,. Título original: L’Archéologie du savoir 
FREIRE, P. (1998). Pedagogia do Oprimido. 25 a ed. (1a edición: 1970). Rio de Janeiro: Paz e Terra. GADOTTI, M. (2003). Teoria, método e experiências Freireanas. Site: Fóruns EJA Brasil, 
url:http://www.paulofreire.org/frontera_p.htm acessado em: 13/03/2019 
SAUL, A. M.; SAUL, A. (2016). Contribuições de Paulo Freire para a formação de educadores: fundamentos e práticas de um paradigma contra-hegemônico. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 61, p. 19-35, jul./set. 



[1]Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas (2018.2), da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).

RELAÇÃO DA FICÇÃO COM A TEORIA E REALIDADE DA APRENDIZAGEM NO BRASIL: CAMINHOS POSSÍVEIS



Juliane Cavalcante Nunes[1]

Apresentação
O ensaio que estou prestes a dividir com você, caro leitor, é recheado com diversos modos de pensar, diversos olhares sob o mesmo objeto, porém eles conversam entre si e as conclusões visam ser interessantes. Então, almejando credibilidade, logo de início trarei um pouco de história, depois teoria, depois fantasia e depois uma mistura dos dois. Aproveitem a leitura.

Um pouco de história.
A educação no Brasil atualmente, tem se modelado de forma heterogênea, por conta dos métodos que vêm se diversificando a cada dia, e sendo reformulados para uma tentativa de se adaptar, não necessariamente ao contexto do aluno, mas às debilidades oferecidas pelo sistema educacional, como forma de cobrir ou driblar essas faltas. O que é preocupante, tendo em vista que o futuro cognitivo e também formativo do aluno depende dessa base. Logo se o sistema se apresenta defeituoso, o aluno ficará com prejuízos.
Assim, partiremos para um pouco de história. A escolarização, da forma que conhecemos, chega ao Brasil através dos Jesuítas, e desde aí ela já tem uma forma autoritária. Em 1599, se promulga o Ratio Studiorum, que padroniza um método que sistematiza o ensino, utilizando-se de um único currículo, que dividia em graus e em conteúdos. O sistema deveria ser efetivado de forma integral, havia um currículo em comum e já se gestava a ideia de redes conectando os colégios,  da forma como temos hoje (Almeida, 2014). O objetivo das redes, permanece até hoje como uma aquisição positiva. Para além disso de lá para cá, era de se esperar que muita coisa houvesse mudado, tendo em vista que 420 anos se passaram. Contudo, o que se nota, é que esse modelo de educação, com o currículo em comum, a divisão em graus e a forma como se passa os conteúdos, a urgência para que a cada final de ano todos os conteúdos tenham sido ensinados (sem a menor preocupação de que de fato tenham sido aprendidos), permanece vigente na maioria da escolas.
É interessante se pensar sobre o aspecto histórico dessa construção escolar, para entendermos o modelo atual e as suas tentativas de mudança. Por que o novo tanto nos assusta? Sabemos que é necessário implantarmos um novo modelo de educação para que ele consiga abranger a todos, um modelo que não privilegie apenas uma forma de aprendizado. Com essa afirmação não quero menosprezar aos que aprendem de forma tradicional, mas quero dirigir o meu olhar para a grande multidão que sofre para aprender com esse modelo, mas de certa forma aprende,  e à outra multidão que não aprende com esse modelo.
Tendo em vista essa reflexão, podemos pensar ainda, que sim, muitas coisas mudaram! Afinal, não temos tantos modelos diversos que vêm sendo experimentados nas escolas? Como por exemplo o construtivismo de Paulo Freire, O modelo cognitivo, a educação à distância. Assim com apenas esses modelos eu derrubaria toda a minha conjectura de que a educação atual se norteia por um modelo arcaico. Porém, se pensarmos um pouco sobre quantas escolas conhecemos atualmente que seguem esses modelos, e quantas escolas (principalmente públicas) que seguem o modelo tradicional, veriamos que está havendo uma mudança porém ela está andando a passos lentos.
Depois Teoria.
Desse modo, ainda há muito o que pensarmos sobre a forma que esses modelos alternativos estão sendo aplicados. Por exemplo, a teoria nos traz muito sobre o que deveria ser feito, como podemos observar no livro “Pedagogia do oprimido”, de Paulo Freire, onde ele traz, teoricamente, como o mecanismo escolar deveria funcionar para, fazer do aluno o protagonista da sua luta e da luta de um outro. Dessa forma a escola deveria fornecer bases para que o indivíduo seguisse rumo a uma mudança de vida, de pensamento e de paradigmas.
Com todo esse ideal, ele gera a ideia do construtivismo, onde o aprendizado é construído na interação e relação, saudável entre professor e aluno. O conteúdo deve começar a ser moldado a partir da realidade da comunidade e deve instigar os alunos a quererem saber mais. Para tanto, logo no primeiro capítulo do seu livro “A pedagogia do oprimido” Freire (1970), traz a ideia de que o homem desalienado sabe que sabe muito pouco e que há muito mais a saber, e que não conseguirá saber tudo, mas o quanto puder aprender vai ajudar no seu processo de crescimento.
Depois fantasia.
Pode ser que soe, até mesmo fantasioso, principalmente com a fonte que citarei, mas é muito interessante ver esse ideal de construtivismo sendo colocado em prática no filme “Uma professora muito maluquinha”, que tem como base o livro de mesmo título, escrito por Ziraldo. O filme se passa na década de 40, numa pequena cidade. A professora Catarina ou “Cate”, como é chamada carinhosamente pelos alunos, dá aula em uma sala de 4ª série, e ela traz os conteúdos de forma dinâmica e lúdica, ela tem ideias, como: não fazer prova, porque ela confia no que os meninos dela aprenderam, não passar atividade para casa, “num tem não, tudo que eles tem que aprender aprendem aqui, quando é que eles vão brincar?”. E por fim, os seus métodos, que são os mais instigantes possíveis, já no primeiro dia de aula, ela pede para que os alunos escrevam o nome da pessoa que está do seu lado, “pois, qual é a graça de saber escrever o próprio nome”, e assim ela embaralha os nomes e pede para que eles coloquem em ordem alfabética, para que eles aprendam. Assim a cada dia ela surpreende a turma com algo novo, ela conta histórias para os meninos, ela dá gibis aos alunos para lhes instigar a vontade de ler, ela os leva para uma aula de campo para aprenderem geografia, ela ensina a tabuada com música, ela inventa uma máquina de ler, ela leva os meninos ao cinema e depois conversa com eles sobre o filme de Cleópatra e em resposta os meninos fazem uma peça com o tema, e apresentam na escola. Assim a classe vai crescendo, e não só em conteúdo, mas também pessoalmente, cada aluno tem uma conexão de amizade com ela, ela não é apenas uma professora, mas uma amiga.
Dessa forma, a magia e inovação está no ar e a felicidade do desejo de aprender começa a incomodar as demais professoras, que na minha leitura são o que atrapalham o ensino. Com a sua fidelidade ao tradicionalismo, elas acham que a professora Cate só faz baubúrdia, há também um certo sentimento de inveja, já que os alunos estão sempre felizes e sempre com vontade de ir à aula. Elas passam o tempo em levar reclamações ao padre, que é o inspetor do colégio, sobre os métodos nada tradicionais da professora Cate. Se esquecem de aprender com ela, de se tornarem melhores do que si mesmas, e pensam apenas em manter a escola nas normas e padrões, que como a gente já viu, foram instituídos há muito (mais de 500 anos).
Ao decorrer desse comportamento anti-prova da professora Cate, as professoras acabam por fazer um abaixo assinado, pedindo que a professora Cate, seja destituída do seu cargo, isso ocorre logo após a professora maluquinha, dizer que não faria as provas de final de ano com a sua classe. Nesse momento do filme, o único pensamento que vinha a minha mente era que de o velho sistema nunca daria lugar ao novo tão facilmente, porque o velho era conhecido era mais fácil, era tido como correto por muitos, e que uma mudança nele abalaria tanto a comunidade que seria melhor ensinar mal à ensinar com algo que te faça gostar daquilo, se eu não tive ninguém precisa ter. O que corrobora perfeitamente com a ideia de Almeida (2014), quando ele diz: “As escolas, na prática, mesmo que de forma dissimulada, não se comprometem em desenvolver a educação de qualidade ou a evolução do ser humano, mas sim o controle e o domínio cultural.”
Uma mistura dos dois.
Dessa maneira, voltamos as ideias de Freire. A educação como transmissora de cultura, e como ferramenta tanto de alienação, como de desalienação, porém ultimamente tem servido mais como o primeiro. E é exatamente isso que o filme “Uma professora muito maluquinha” quer trazer, que quando criança temos toda a vontade de aprender o saber, e quanto mais aprendemos mais crescemos, porém isso nos é retirado pela escola, o que acaba nos alienando, e nos fazendo submissos a uma educação bancária. Que, no filme é retratado através das personagens das demais professoras, que só querem impor aos seus alunos um conhecimento, no formato que vem do livro, que são recortes de uma realidade tão tão distante, assim as crianças permanecem a perguntar: “A gente já chegou? A gente tá chegando? A gente já chegou?...” Já que o caminho para eles acaba sendo longo e chato para se chegar tão tão longe, nessa estrada do saber.
Avançando mais nessa linha de pensamento, de caminhadas difíceis por caminhos tortuosos, podemos pensar um pouco sobre o filme “Sementes podres”, ele traz para a discussão os alunos “problemáticos” das escolas, aqueles com dificuldade de aprendizado, aqueles bagunceiros, aqueles “maloqueiros”. O filme tem como pano de fundo uma ONG, que tenta ajudar essas crianças nas férias, com um programa de reabilitação e reforço escolar. Porém, apenas o primeiro dia é obrigatório. sendo assim o programa geralmente não tem muita aderência. O diferencial do filme, se dá porque quem vai conduzir todo esse processo é um ex ladrão de rua (Wael), que armava com a sua madrasta para roubar. Tudo que a madrasta quer é que ele tenha oportunidades para não precisar roubar, e ela só o ajuda para que ele não vá para a cadeia. Entre passado e presente, muita coisa vai se entrelaçando, tanto na história de Wael, quanto na dos 6 meninos que ali estão.
É interessante ver como o Wael faz para chamar a atenção deles logo no primeiro dia de aula, eles estão fazendo uma espécie de greve de silêncio, pois não queriam está ali. Assim ele começa a com um diálogo entre ele e um menino imaginário e o expulsa da sala, logo após ele finge atender uma ligação, sai da sala e fica espreitando atrás da porta para ver se eles vão falar. Eles discutem sobre o porquê o menino teria sido expulso. Assim a sua estratégia é conhecer a turma de forma indireta. Depois ele começa a contar uma história de assassinato e assim que ele vai chegando a quem foi o assassino, ele finge receber outra chamada sai da sala para ouvir a discussão deles sobre quem é o assassino. Desse modo os meninos discutem e quando estão em certo ponto ele entra novamente na sala e pede para ouvir deles quem eles acham que é o assassino, daí alguns começam a falar. Já é um avanço muito grande, ele precisa que seja bom para que os meninos voltem, pois se não voltarem o dono da ONG o denunciará, pois quase foi roubado por ele no início do filme.
Nesse caminho a narrativa vai se desenrolando e ele inventa a cada dia maneiras de surpreender e ensinar aos meninos, sobre a vida, sobre os sentimentos, sobre conteúdos, sobre estratégias, enfim ele ensina muito em cada dia. Ele os inspira, e os ajuda a resolverem problemas reais do seu dia a dia, problemas que antecedem e tem uma ligação com o fato de aqueles adolescentes estarem ali. E é justamente isso que a educação representa para mim, um suporte para a vida, um local onde se aprende a contar para os pais que se sofre abuso sexual, um logar com o qual se pode contar para denunciar um traficante que te obriga a vender droga, um local em se aprende que mesmo você tendo um QI maior do que o de todos ali, sempre existirá uma área em que outra possa te superar e é isso que nos faz humanos.
Pode até parecer utópico, surrealista e fantasioso, mas a educação tem esse poder. E é por isso que escrevo esse ensaio, porque muito poder vem sendo desperdiçado, sem querer parecer um livro de auto ajuda agora, e correndo até o risco de soar meio clichê, mas sim, a educação pode despertar em nós o melhor de cada um, pode apontar onde podemos melhorar, pode nos estimular o máximo a sermos o melhor que podemos ser, por completo. Saber matemática, física, química, biologia, português, geografia, história ou artes é sim muito importante e isso merece ser aprendido, nos faz crescer muito, mas gostar disso, aprender a dizer não, aprender a conviver com o diferente e respeitá-lo, aprender as regras sociais e a sua importância (ou desimportância) ou aprender como elas foram moldadas e como moldá-las para um muito mais equitativo, faz toda a diferença, nos faz expandir como o universo, em uma explosão de cores, luzes e até sons, nos faz querer descobrir mais sobre cada pedacinho interno e externo do mundo e de si. Esse é o papel da educação.
Mas como colocar toda essa magia em prática? Não existem mais varinhas de condão, nem tudo se resolverá em um bibiti bobiti bu! Na verdade, até mesmo esses filmes mágicos estão sendo repaginados hoje, e têm demonstrado que as atitudes podem mudar o curso que a história vem tomando. Não podemos apagar o que já fizemos até agora, mas podemos inovar a cada instante. Seria necessária uma reestruturação de mundo? Externo e interno de cada ser, e pra ser bem realista, já que estamos falando de magia e mundo real, muita gente não vai se convencer disso, mas os que se convencerem podem contagiar cada aluno seu, transformando devagarzinho uma geração, em uma geração de seres que sabem estar expandido e sabem a importância de conhecer.
Por fim, ainda há uma distância entre a teoria real de Paulo Freire, a teoria misto fantasia com realidade de Ziraldo e de “sementes podres”, e a realidade concreta que vive e respira para além dos muros das teorias, cabe a nós sonhadores profissionais construir a ponte do saber entre esses mundos paralelos.

Referências:

ALMEIDA, W. R. A. A educação jesuítica no Brasil e o seu legado para a educação da atualidade. Revista Grifos, Unochapecó, N 36/37, p. 117-126, 2014.

FREIRE, P. A pedagogia do oprimido. 11. ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1970.

SEMENTES podres. Direção de Kheiron. Filme original da Netflix, 2018. Duração 110 min.
Disponível na Netflix.

UMA professora muito maluquinha. Direção de André Alves Pinto e César Rodrigues. São João del Rey (MG): Globo Filmes, 2011. Duração 90 min. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sGbQ_g4YrDo





[1]Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas (2018.2), da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).