sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Aula sobre amor - ou sobre "realidade e sonho"


Vou levar você para os meus sonhos

Alguns dizem que o amor platônico é sintomático de alguém que, na impotência ou na impossibilidade da realização plena do seu amor, busca, no mundo das ideias, uma compensação. Deixando de lado todo o psicologismo que se encerra neste tipo de leitura, o amor platônico ainda assim é uma vivência, é uma experiência do possível, do que é possível (pelo menos no momento) - não que esteja a defender o amor platônico como modelo de existência. Na verdade, na verdade mesmo, o melhor, pelo menos acredito eu, o melhor é o amor encarnado, realizado em suas máximas. 
Mas quando ele, o amor, é dificultado, é não correspondido, é proibido, é inviabilizado ou mesmo quando é interrompido, o que resta? Resta o sonho, resta o mundo onírico, resta a fantasia, resta o mundo das ideias. Aliás, o sonho é outra coisa em relação ao mundo das ideias. O mundo das ideias, tal como o modelo platônico, é um mundo da razão. O mundo dos sonhos é regido pelo desejo, pelo inconsciente, pela volúpia, pela lassidão, pela libertação total dos instintos. Portanto, não tem nada a ver com aquele mundo das ideias platônico.
De uma maneira diferente, o sonho para alguns é visto como uma realidade que, muitas vezes, se confunde com essa nossa outra realidade. Diz uma história de um sábio oriental que, ao sonhar sendo uma borboleta acordou acreditando que poderia estar sonhando em ser um homem que havia sonhado em ser uma borboleta. Então aonde existiria mesmo a linha divisória entre aquilo que comumente se chama realidade e o sonho?
O sonho, nesse sentido, seria uma realidade. Ou pelo menos outro tipo de realidade. Realidade enquanto vivência, enquanto experiência...
Levá-la, portanto, para o mundo dos sonhos, é o que resta, é o que é possível. Levar o amor, quer dizer, viver o amor na sua dimensão onírica é se entregar a sofreguidão da experiência inevitável de se largar no embalo de tudo que consiste em relação ao amor.
Sim, a experiência. Ainda assim é uma experiência. O amor sofrido, doido, não juntado, não colado, não amancebado, interrompido, vivido por um ente apenas é ainda digno de afirmação. E diria até mais: é privilégio daquele que o vive, é expressão de vida daquele que sente, mesmo que sinta na “sofrência”.
Por estas e outras é que levarei você aos meus sonhos. Neles, carregarei você em cavalos selvagens e nobres. Andarei contigo em campos formosos, aonde o vento soprará teus longos cabelos. De mãos dadas caminharemos pelos prados, nos olharemos apaixonadamente e sentiremos o mundo perfeito porque nossa união quer assim. A vida será uma delícia na medida da nossa entrega e tudo de um será do outro. Os sentidos, tão absurdamente acentuadas, dominarão nossos corpos em insaciáveis reincidências de querer mais, mais uma vez e cada vez mais. Tudo, tudo isso repleto de uma abençoada pureza que transcende a fugacidade de um querer saciar os desejos. É algo a mais, com toda certeza tem algo que ultrapassa o tempo e o espaço. É tão incomensurável e tão, muitas vezes, sem sentido, que piram as explicações que queiram ser lógicas. Mas para que a lógica?
Levarei você para os meus sonhos. Assim, poderei dormir contigo e estarei ao teu lado, livre, liberto. Ao dormir, acordarei em sonho com você. Você será minha, sem problemas, sem medos, sem culpas, sem preocupações. O que resta... Não por minha verdadeira vontade... mas é que me resta e o que posso afirmar.
Nos sonhos você será minha rainha, minha deusa.. eu serei teu homem, teu forte, teu tudo. A posse será desejada as inversas porque adorarei te pertencer e você adorará me pertencer. E as palavras, muitas vezes supérfluas, serão proferidas para ratificar o que já é óbvio e para mimar os ouvidos.
Tantos, tantos sonhos desejados porque neles você estará. Tantos, tantos sonhos sonhados quanto forte e intenso for o amor. E neles poderemos viver o que for possível porque em outra dada realidade foi impossível.  
Vou levar você para os meus sonhos como quem rouba a mulher alheia. Tomarei posse de você e será minha para sempre. Serei teu dono, todo seu, passível, apaixonado, doido por você. E no gosto dos teus beijos deixarei tudo rolar, abrindo minha alma, misturando a você. Apertarei teu corpo, trarei você para mim, sentirei teu calor, alisarei tua pele, brincarei em teus lábios... Finalmente, rolaremos como perdidos e deixaremos tudo acontecer, oscilando entre a brabeza de um duelo e a doçura de duas crianças. Risos fugirão de nossas faces ao mesmo tempo em que o desespero do saciar comporá tudo que há. Corpos molhados, suados, ávidos, duros, tesos, sedentos, famintos, querendo e impossíveis de se deter serão donos soberanos.
Nos sonhos, tudo liberto, não haverá limites para o pare, para o não pode, para o tenho que ir, para o que vão pensar. Tudo estará em paz e todo o sossego necessário já estará lá. A culpa, a dúvida e a insegurança serão banidas eternamente. Sua vida e minha vida não serão jamais duas partes. Embora dois corpos visíveis... o sentido será um só. As trocas, os fluidos, as entranças, o de um e o de outro, tudo estará confluindo e convergido em um apenas. As mãos, as nossas mãos juntas, as pernas, as nossas pernas cruzadas, os braços, os nossos braços nos enlaçando, os rostos, os nossos rostos juntinhos, as bocas, as nossas bocas coladas, os olhos, os nossos olhares fitando um ao outro apaixonados. De tudo um tudo, de um detalhe o máximo, de um simples toque todo o prazer. E a vida vai encantada dançando uma música produzida pelo amor que exala de nós.
Vou levar você para os meus sonhos...esta noite, ao menos quero sonhar com você e lá tudo será. Será a verdade, será a brevidade do que for possível mesmo que na volátil substância onírica. Viveremos nossos destinos e acatarei o que for produzido pela chama. E estarei lá com você até a última gota de luz. Serei testemunha do fim quando este chegar.
Vou levar você para os meus sonhos e serei fiel e íntegro indo aonde for, chegando aonde chegar, mesmo que um dia acorde e não mais consiga te encontrar.
Vou levar você para os meus sonhos.

5 comentários:

  1. Parabéns pelo texto!

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  2. Lá é tudo sonho, tudo verdade
    Doce delírio, luz suave.

    Muito bom o texto. Novo seguidor, professor =)

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  3. Minha palavra é saudade.
    Saudade daqueles tempos em que eu tinha o privilégio de ter você como colega na UNIFACS.
    Cara, vou lhe visitar um dia no São Francisco.
    Levando mulher e filhos, que aliás estão enormes e lindos!

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