No dia seguinte, Isabela, minha filha, teria
uma avaliação de interpretação textual e ciências (as avaliações,
acertadamente, eram interdisciplinares). Aos 8 anos, Isabela começava a
vivenciar, de modo intensivo, algumas práticas mais típicas do processo de
escolarização, como as avaliações mais formais.
Ela estudava meios de transporte e as
mudanças ocorridas ao longo do tempo, como os bondes puxados a cavalo, o tempo
dos bondes elétricos, os primeiros automóveis e os congestionamentos e
poluições urbanas de hoje em dia.
À medida de ela ia lendo, em seu livro, os
textos referentes aos vários tipos de transporte, conversávamos sobre as
diferenças e curiosidades
de cada época em se tratando dos meios de transporte, obviamente.
Assim, a conversa fluía sobre lugares de
primeira classe e segunda classe, velocidades de cada meio de transporte, a
questão do conforto e mesmo da facilidade em ter acesso ou não. Em uma dessas
conversas, Isabela observou que atualmente muitas pessoas têm mais carros do
que antigamente. Nesse momento estávamos diante de duas figuras contrastantes
em seu livro. Uma figura mostrava uma rua do início do século XX, onde havia
alguns poucos carros e muitos pedestres, transparecendo atabalhoadas e
confusas, possivelmente por conta da novidade do veículo motorizado. Na outra
figura, mais contemporânea, havia um congestionamento monstruoso, com muitos
carros e raros pedestres.
Ao fazer a constatação do acesso à
propriedade do meio de transporte, no caso o carro, a questionei sobre o que
seria melhor: aquela época com poucos carros ou hoje em dia com muitos carros?
Isabela ponderou e disse que ter carro é
confortável e que antes era perigoso andar na rua, pois as pessoas ainda
estavam se acostumando com os veículos motorizados. Acenei que ela estava
correta, mas acrescentei que hoje em dia, por muitas pessoas terem carros, os
congestionamentos são enormes e que termina por não adiantar ter um carro se
não se pode sair do lugar. Ainda falei da poluição que tantos carros produzem.
Foi a vez de Isabela concordar. Daí, questionei se haveria alguma outra
alternativa melhor para a mobilidade e expliquei um pouco o sentido de
transporte coletivo e mais sustentável do ponto de vista ambiental. Isabela
também expressou entendimento e concordância.
Notei que o nosso diálogo tinha uma boa
cadência, pois estávamos trocando pontos de vistas, concordando com algumas
observações e trazendo novas contribuições (não que o não concordar com algo
seja indesejável - ao contrário!). Naquele momento pontuei para Isabela que
estávamos tendo uma conversa crítica, desenvolvendo um pensamento crítico. De
imediato, Isabela perguntou o que seria o pensamento crítico. Tentei explicar
que seria ter visões diferentes sobre a mesma coisa. Por exemplo: ter um carro
é algo confortável, mas pode provocar congestionamentos e gerar poluição.
Sem pestanejar, Isabela disse que havia bem
entendido. Da parte dela, assim falou: “Ah pai! Sei o que é! Por exemplo: comer
hambúrguer faz mal, mas é gostoso!”
Depois dessa fiquei perturbado quanto aos
meus papos sobre uma alimentação mais saudável! Quem manda mediar o
desenvolvimento via um pensamento crítico e, consequentemente, autônomo!?
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