sábado, 21 de abril de 2018

UNIVERSIDADE ABERTA DA TERCEIRA IDADE: Nunca é tarde para adquirir conhecimento


Maria Aparecida de Freitas Nascimento•


A abordar a educação, sobretudo as Políticas Públicas para a Educação, vem à tona a importância da educação plural, diversificada, acessível a todos, sem discriminação de raça, cor, gênero, classe social, religião e idade. Uma educação voltada não só para o Ensino Infantil, Fundamental, Médio e Superior. Uma educação além do tempo e da idade, uma formação, onde o que mais importa é a vontade. Vontade de aprender, vontade de saber, vontade de adquirir conhecimento, de se relacionar, de se sentir vivo, útil, de ser cuidado. Mas, o que vemos é que, quando se fala em educação, se pensa logo em jovens, em Ensino Fundamental, Médio e Ensino Superior. Ou então, há uma dedicação exclusiva ao Ensino Infantil. Com isso, deixa-se de lado a população idosa, que perante a sociedade, pelo menos em nossa sociedade, é uma população esquecida.
Debert, citado por Barreto (2003), aponta que, quando se falam em idosos, referem-se à uma velhice abandonada, solitária e empobrecida, relegada a um plano secundário nas sociedades industrializadas.
É imprescindível observar que o processo de envelhecimento é natural, próprio do ser humano, como nascer, crescer, se reproduzir, envelhecer e morrer. É um processo de mudança, de transformações, de alterações na aparência física, comportamentais, nos papéis sociais e nas suas relações ao longo dos anos. (PORTELLA, 2004 citado por WEBBER, 2007).
Existem processos de envelhecimento, não somente um modo único de envelhecer, e que vai depender do gênero, da raça, da classe social, da cultura, que são determinadas socialmente. E essa diferença do modo de envelhecer se dá devido às desigualdades das condições de vida e saúde, de trabalho e relações as quais estiveram submetidos. (BOUTIQUE; SANTOS, 2005 citado por WEBBER, 2007).
Ser idoso na sociedade atual é sinônimo de saúde, trabalho, independência, autonomia, apresentando uma boa capacidade funcional, intelectual e cognitiva. (MORAES, 2004 citado por WEBBER, 2007). A velhice tem sido vista como uma etapa da vida onde se há mais prazer, satisfação, realização pessoal, sendo mais maduro e produtivo, e com isso, novas posturas foram sendo tomadas frente a esse novo modo de envelhecer. (CACHIONi, 1998).
A exemplo desse novo modo de envelhecer, podemos citar o escritor português, José de Sousa Saramago, que decidiu ser escritor profissional aos 60 anos de idade, ganhando diversos prêmios, como o Prêmio Nobel de Literatura, em 1998, aos 75 anos de idade. Destacamos também Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares Filhos, mestre das curvas de concreto, que no auge dos seus quase 100 anos de idade, elaborou um de seus últimos e encantadores projetos, o Centro Cultural Internacional Oscar Niemeyer, inaugurado em 2011 na Espanha, ganhando muitos prêmios como “O melhor Projeto Nacional de Barcelona”. (ORDONEZ, 2013).
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta o crescente aumento da proporção de pessoas idosas no país, as pessoasde 40 a 59 anos aumentaram de 19,8% para 25,1%, as pessoas de 60 anos ou mais de idade se elevou de 9,0% para 13,8% entre 2001 e 2014. (IBGE, 2015). Esse aumento acelerado da população idosa e o impacto que ele causa à sociedade tem sido motivo de discussão nos meios políticos e acadêmicos, a fim de buscar meios adequados para o enfrentamento dessa realidade no Brasil. (Barreto, 2003).
O aumento da população idosa no Brasil também fez com que aumentassem os programas e atividades dedicadas ao público idoso, valorizando a vivência coletiva. Um desses programas é a Universidade Aberta da Terceira Idade – UnATI, que tem como objetivo desmistificar os estereótipos e preconceitos quanto ao envelhecimento, promovendo o resgate da auto-estima, cidadania, dando oportunidade de conhecimento, incentivando a autonomia, a independência, a realização pessoal, a autoexpressão e a busca por um envelhecimento saudável e bem-sucedido. (PALMA, 2000, citado por IRIGARAY, 2008).
Pierre Furtes, citado por Ordonez (2009), tem uma frase que diz: “O homem, por ser inacabado, tende à perfeição. A educação é, portanto, um processo contínuo que só acaba com a morte”. 
Adélia Prado, citada por Cachioni (1998), diz: “Meio século. O peso desta palavra ia me deixar de cama. Não vai mais. Aprendo sabedorias”.
Isaac Asimov, também citado por Cachioni (1998), diz: “Algum problema de envelhecimento? Nenhum! Traga de volta os cidadãos maduros e idosos à escola. Sob tais condições, integrando-os ao processo de aprendizagem, por que eles não deveriam permanecer criativos e inovadores até o fim de suas vidas”?
Como vimos, para se adquirir conhecimento não tem idade, nem sexo, nem raça, nem cor, nem classe social. E a Psicologia e a Gerontologia corroboram para que se integrem os idosos na vida social e educacional, pois, as novas aprendizagens contribuem para manter a funcionalidade, a ativação cerebral, prevenção ao Alzheimer, a flexibilidade e a possibilidade de adaptação dos idosos. Para a Psicologia, o envelhecimento não representa só perdas, doenças, afastamento e sim ganhos evolutivos também, onde a educação é um importante meio de promoção à uma velhice mais saudável e bem sucedida, com qualidade de vida biológica, psicológica e social, intensificando os contatos sociais, a troca de vivências e de conhecimento. (CACHIONi, 1998).
O Capítulo V do Estatuto do Idoso, em seus artigos e incisos abaixo, nos diz: 
Art. 20. O idoso tem direito a educação, cultura, esporte, lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua peculiar condição de idade.
Art. 21. O poder público criará oportunidades de acesso do idoso à educação, adequando currículos, metodologias e material didático aos programas educacionais a ele destinados.
§ 1o Os cursos especiais para idosos incluirão conteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demais avanços tecnológicos, para sua integração à vida moderna.
§ 2o Os idosos participarão das comemorações de caráter cívico ou cultural, para transmissão de conhecimentos e vivências às demais gerações, no sentido da preservação da memória e da identidade culturais.
Art. 22. Nos currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal serão inseridos conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, ao respeito e à valorização do idoso, de forma a eliminar o preconceito e a produzir conhecimentos sobre a matéria.

No Brasil, na década de 1970, em São Paulo, foram fundadas as primeiras Escolas Abertas para a Terceira Idade do SESC (Serviço Social do Comércio). A Universidade Federal de Santa Catarina, em 1982, foi a primeira a aderir o movimento da Universidade Aberta à Terceira Idade. Temos mais de 200 programas por todo o país em instituições públicas e privadas. (ORDONEZ, 2009)
Na Universidade Federal de Pernambuco, o Programa Universidade Aberta à Terceira Idade foi criado em setembro de 1996, com a proposta de uma microuniversidade temática, abordando temas como: envelhecimento, promovendo a integração universidade-idoso-comunidade. (BARRETO, 2003).
Irigaray (2008), citando alguns autores como Neri (1996), Guerreiro (1993), Silva (1999) e Castro (1998), nos mostra que a maior procura dos idosos por universidades da terceira idade é, prioritariamente, para evitar a solidão, bem como, a busca por conhecimentos, autoconhecimento e desenvolvimento, contato social, ocupação do tempo livre, ampliação do círculo de amizades, necessidade de complementar a educação e se atualizar, troca de experiências e melhoras na imagem social.
Castro, 2004; Goldstein, 1995 e Debert, 1999, citados por Irigaray (2008), destaca que nas universidades para a terceira idade, a predominância é de mulheres, representada pela maioria da população, e devido a serem elas as que mais se preocupam com a saúde e com o envelhecimento, são as mulheres que mais percebem as mudanças e tem mais interesses culturais, já os homens se interessam mais por assuntos políticos. 
Em geral, os currículos das Universidades da Terceira Idade são dinâmicos, adequados à terceira idade, atendendo os idosos em fase de transformação, com conteúdos voltados para saúde, cultura, esporte, lazer, cidadania, trabalho e voluntariado, promovendo vida ativa e autonomia. Inclui também exercícios físicos, dança, música, alimentação balanceada, bem como estratégias para aliviar tensões emocionais e psíquicas e participação na promoção e defesa dos direitos humanos. (Formosa, 2010; Veras; Caldas, 2004; Yenerall, 2003 & Fenalti; Schwartz, 2003, citados por Ynouye, 2018).
Na UNIVASF, Universidade Federal do Vale do São Francisco, existem vários programas de promoção de saúde, bem-estar e conhecimento à população idosa. A UnATI da UNIVASF, através do Programa Vida Ativa – PVA, fruto de uma ação de extensão do curso de Educação Física (CEFIS), criado com financiamento do Edital do Ministério da Educação (MEC-PROEXT), objetiva a promoção da saúde e qualidade de vida da população idosa das cidades de Juazeiro-BA e Petrolina-PE, com atividades multidisciplinares. (Nascimento, 2016).
Iniciado em 2012, com o Projeto “Pilates e o Idoso: Contribuições para o Equilíbrio Corporal”, projeto de extensão do CEFIS/UNIVASF, e em sua quinta edição na atualidade, o PVA foi ganhando corpo e com caráter interdisciplinar em 2013. Em 2014, houve um aumento considerável de idosos que procuravam o programa, obtendo uma lista de espera de 150 pessoas. (NASCIMENTO, 2016). 
Sob a coordenação de um professor de Educação Física, a equipe é composta por 39 alunos (15 bolsistas e 24 voluntários), orientados por 15 professores de oito cursos de graduação da UNIVASF: Administração, Artes Visuais, Ciências da Computação, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Medicina e Psicologia. E suas atividades estão distribuídas em seis áreas: Esporte e Lazer (Natação, Hidroginástica, Musculação, Pilates, Tênis, Defesa Pessoal, Ginástica Geral e Caminhada), Saúde (Ciclo de Palestras: Enfermagem, Medicina e Farmácia), Psicossocial (Dinâmicas de Grupo e Ciclos de Palestras), Artes Visuais (Dinâmicas: Desenho, Pintura, Escultura, História da Arte, Computação), Língua Estrangeira (Inglês e Espanhol) e Envelhecimento Planejado e Bem Sucedido. (Nascimento, 2016).
Em 2014, com o objetivo de fomentar a extensão, o ensino e a pesquisa, criou-se a UNATI da UNIVASF, a partir do PVA, com foco nas áreas de Gerontologia e Envelhecimento Ativo, dispondo à baixo custo e alto potencial, à difusão da educação continuada, e à prevenção e atenção em saúde dos idosos. (Nascimento, 2016). 
Os serviços oferecidos pelo PVA são gratuitos, de segunda a sexta-feira, no período da manhã e da tarde. Os idosos foram distribuídos em 10 grupos de acordo a modalidade de Educação Física que praticavam e cada grupo participa do programa duas vezes na semana, por um período de 50 minutos. Além da atividade de Educação Física, cada grupo participa de palestras, dinâmicas e oficinas, totalizando 19 horas de participação no programa. (NASCIMENTO, 2016).
O PVA conta com a participação média de 160 idosos, na faixa etária entre 60 a 85 anos, com 95% do público feminino, sendo 62,5% casados e 16,8% viúvos. Quanto à escolaridade, 36,6% tem o Ensino Fundamental incompleto, 15,6% tem o Ensino Médio incompleto e 13,1% o Superior incompleto. Somente uma idosa relatou não saber ler e escrever e dois não possuíam nenhuma formação, mas sabia ler e escrever. (Nascimento, 2016).
Até o momento o PVA tem cumprido seus objetivos iniciais de criação, pois, em pouco tempo este projeto de extensão tornou-se uma ação de empoderamento dos idosos e dos bolsistas e voluntários que dele participam, proporcionando uma transformação nos hábitos de vida dos idosos, onde adquiriram ampliação dos seus níveis de saúde e qualidade de vida, bem como acesso à educação continuada. (Nascimento 2016).
Podemos então concluir, que programas de educação para idosos é fundamental para que o processo de envelhecer seja ressignificado e que novas vivências sejam experimentadas e sentidas nessa nossa visão de idoso ativo, consciente, empoderado, útil, tendo seu projeto de vida renovado, seus ideais reconfigurados e novas perspectivas e expectativas de realização de sonhos alcançados. É promover oportunidades para que o idoso exerça a sua cidadania de forma livre, autônoma, expressando a sua personalidade e buscando um autocuidado para o alcance da felicidade. (Webber, 2007).
Corroborando com Webber (2007), é imprescindível a ampliação de programas como esses para o alcance do maior número da população idosa do país, a fim de que muitos, que ainda permanecem em casa, curtindo a sua velhice, possam experimentar os benefícios que tais práticas proporcionam. É através dessas oportunidades em que a individualidade do idoso é respeitada, onde há troca de experiências e conhecimentos que o ser humano se desenvolve, se percebe como indivíduo e é capaz de promover transformações na sociedade. Por isso, NUNCA É TARDE PARA ADQUIRIR CONHECIMENTO.
Referências Bibliográficas:

BARRETO, K. M. L., CARVALHO, E. M. F., FALCÃO, I. V., LESSA, F. J. D., & LEITE, V. M. M. (2003). Perfil sócio-epidemiológico demográfico das mulheres idosas da Universidade Aberta à Terceira Idade no estado de Pernambuco. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil3(3), 339-354. https://dx.doi.org/10.1590/S1519-38292003000300013

BRASIL. Estatuto do Idoso (2008). Lei no 10.741, de 1o de outubro de 2003, e legislação correlata, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso. – 3. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Centro de documentação e informação. Edições Câmara, Brasília.

CACHIONI, M. (1998). Envelhecimento bem-sucedido e participação numa universidade para a terceira idade: a experiência dos alunos da Universidade São Francisco. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2015). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: síntese de indicadores 2014 / IBGE, Coordenação de Trabalho e Rendimento. - Rio de Janeiro: IBGE, 2015. 102 p. 

IRIGARAY, T. Q., & SCHNEIDER, R. (2008). Impacto na qualidade de vida e no estado depressivo de idosas participantes de uma universidade da terceira idade. Estudos de Psicologia, 25 (4), 517-525. 

INOUYE K.; ORLANDI, F. S.; PAVARINI, S. C. L. & PEDRAZZANI, E. S. (2018). Efeito da Universidade Aberta à Terceira Idade sobre a qualidade de vida do idoso. Educação e Pesquisa, 44, e142931. https://dx.doi.org/10.1590/s1678-4634201708142931. Recuperado em 04 de abril de 2018.

NASCIMENTO, M., PEREIRA, L., COELHO JÚNIOR, E., COSTA, H., & RAMOS, M. (2016). Programa Vida Ativa: Saúde e qualidade de vida do idoso nas cidades de Petrolina-PE e Juazeiro-BA. EXTRAMUROS - Revista de Extensão da Univasf, 4(1). Recuperado April 4, 2018, de http://www.periodicos.univasf.edu.br/index.php/extramuros/article/view/857/547

ORDONEZ, T. N., CACHIONI, M. (2009). Universidade aberta à terceira idade: a experiência da escola de artes, ciências e humanidades. Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano. Passo Fundo, v. 6, n. 1, p. 74-86, jan./abr.

ORDONEZ, T. N. (2013). Conhecendo e entendendo a Universidade Aberta à Terceira Idade. Aproveitando a terceira idade. http://www.aterceiraidade.net/conhecendo-e-entendendo-a-universidade-aberta-a-terceira-idade. Recuperado em 01 de abril de 2018.

WEBBER, F., CELICH, K. L. S. (2007). As contribuições da universidade aberta para a terceira idade no envelhecimento saudável. Estudos Interdisciplinares sobre o Envelhecimento. Porto Alegre, v. 12, p. 127-142.


Estudante da disciplina Educação e Políticas Públicas , da ênfase de Educação, do curso de Psicologia da Univasf (Prof. Marcelo Ribeiro).

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