Por Victória Ferreira Duarte
Disciplina Educação e Políticas Públicas
Este ensaio
tem por objetivo evidenciar as incoerentes implementações de políticas públicas
como não efetivadas pelo intuito do bem social, mas a serviço de interesses
particulares e mantenedores do status quo.
Pensando especificamente sobre o Brasil, muitas das políticas apresentam-se
como conservadoras de uma eugenia eurocêntrica e patriarcal, embasada em uma
moral cristã de separação entre bons e maus ao funcionamento da sociedade. De
modo muitas vezes encoberto e naturalizado pelas mídias de massa, são
justificadas guerras e colocados bodes expiatórios sobre sujeitos
historicamente estigmatizados e marginalizados pela lógica do capital. Lógica
essa que beneficia a poucos e cria uma ilusão meritocrática para que haja a
continuidade e conservação das desigualdades socioeconômicas. Com o passar dos
anos do nosso Brasil pós-colonial, muitos protestam e se indignam com as
criações da classe elitista a mandar e desmandar sobre os demais e, em virtude
desta pressão ocorrente, algumas reformulações são efetivadas de modo a ceder
ou reescrever os modos de opressão.
Como exemplo
a ser aqui debatido, trago a famosa guerra as drogas. Guerra esta que se ilude
aquele que imagina que o real alvo são as substâncias ditas ilícitas, mas sim
os povos negros, indígenas, periféricos, moradores das favelas como os
quilombos urbanos. Pois a estes, restam a chibata transformada em arma de fogo,
ou a senzala transformada em presídios de segurança máxima. E assim também, os
seus capitães do mato intitulados hoje de policiais militares, que a serviço de
seus senhores e a sua proteção, agridem sem dó aos povos periféricos e estudantes
que se ousarem rebelar contra o poderoso "Estado Democrático".
Democrático? Poder ao povo? Que povo é esse detentor de poder, se nem o poder
de comer, morar, estudar, cuidar ou consumir lhe é concedido? E isso não estava
escrito na constituição? Então para que serve essa tal constituição? Crime no
Brasil é ser pobre, ser negro, ser mulher, ser periférico. Mas isso não está
escrito na constituição, está escrito na realidade dos povos nativos
(indígenas), nordestinos, e afrodescendentes.
Para melhor
contextualização sobre a política de extermínio às “drogas”, podemos pensar o
Brasil historicamente em suas produções e relações. Segundo a Organização
Mundial de Saúde (OMS), droga é qualquer substância que ao entrar em contato
com o organismo, resulta em alterações fisiológicas e/ou de comportamento.
A partir
disto podemos enquadrar neste conceito diversas substâncias, tais como o café
(costume brasileiro desde tenra idade à população, e grande fonte econômica do
nosso país colonial), o álcool (também grande costume desde a produção
açucareira de cana, e bem vista até os nossos dias atuais pela mídia), o
chocolate (paixão de muitos), a ritalina (que tem hoje o Brasil como segundo
maior consumidor mundial), a maconha (que também não fica atrás em seu alto
consumo e sua vasta cultura, sendo historicamente predominante aos povos negros
e sertanejos ribeirinhos no Brasil, e aos povos latinos nos EUA), a cocaína
(que facilmente percebemos sua vasta circulação do senado aos seus helicópteros
e aos bares de intensa bebedeira), entre outras substâncias.
Desse modo,
fica fácil reinventar as políticas de manutenção do sistema, se os direitos
humanos não nos deixam mais escravizar nossos iguais e criminalizá-los por não
obedecer. Então, criminalizemos suas práticas. É só não lhes dar possibilidades
de ascensão, de estudo, e como isca fácil, o tráfico de drogas como
possibilidade de dinheiro rápido e respeitabilidade social. Tudo isso imposto
através de políticas do medo e do poder do gatilho. Levando em consideração
também, que através do artigo 33, responsável pelo tráfico de drogas e sua
penalização, não é determinada uma distinção sobre aquele que é usuário e
aquele que é traficante, cabendo ao contexto e a subjetividade daquele que
julga, enquadrar ou não o sujeito.
É só parar e
observar o saldo desta grande guerra, nesses anos de instituição
da lei de drogas, vejam só que surpresa, as drogas ainda existem em quantidade
igual ou quiçá maior ao decorrer do seu período de proibição. Em compensação,
tantas vidas deixaram de existir, tantas vidas encarceradas e quantas outras
enclausuradas em manicômios intituladas de doentes mentais. Seria essa então a
lógica proibicionista, que proíbe os seres de sua própria existência? Assim,
mais uma vez apresentando na história da humanidade que em uma guerra, só
existem perdedores.
Quanto
tempo mais levaremos para compreender que a melhor estratégia para
implementação e avaliação de novas políticas públicas é aquela que se baseie
pelo amor? Não aquele amor romântico percebido nas novelas ou romances
dolorosos, mas amor enquanto empatia, união de povos, cooperação, cuidado, e
reconhecimento do outro como parte de mim, em uma unicidade formada por átomos,
pertencentes a um mesmo planeta girando em torno de um mesmo Sol. Amor frente
aos animais, às plantas, águas, ao ar e aos demais homo sapiens sapiens. Quanto
tempo mais nossa espécie - que já chegou a pisar na Lua e a resolver complexas
fórmulas matemáticas - levará para a compreensão do respeito?
E assim, com
a Psicologia e o estudo sobre as políticas públicas existentes, trazemos suas
lógicas e incoerências, é o mal-estar da civilização, ou como eu chamo,
a patologia do sistema em que se é colocado o ganho de capital como fim último
em detrimento ao ganho social. Põe-se números, ambições e poder acima do bem
maior que consiste no bem da vida. Sugiro aqui que retomemos ao amor e ao
cuidado nas ações públicas, e descaracterizemos o uso de substâncias como caso
de polícia, e sim como um sintoma societal que nos clama por diferentes
intervenções. Devemos assumir que essas substâncias são parte importante de uma
evolução conjunta entre o ser e o seu meio, aderindo a estratégias de Redução
de Danos e aumento de segurança no uso. Precisamos de mais estudos, mais pesquisas
que nos apresentem uma compreensão real, pesquisas essas também hoje
embarreiradas pela proibição. Devemos nos atentar também às questões sociais e
psíquicas envolventes ao usuário, partindo do acolhimento e não da exclusão
como estratégia interventiva. O tráfico e a violência só existem porque há a
proibição legal, necessitamos de regulamentações e educação sobre o uso e seus
reais efeitos e malefícios. Educação para transformar, recriar e reinventar,
ampliar e acolher, responsabilizar e compreender.
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