sábado, 24 de agosto de 2019

CONTRIBUIÇÕES DE BOURDIEU SOB AS DESIGUALDADES DE CAPITAL CULTURAL, SOCIAL E SIMBÓLICO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Por Valéria Varandas Phydias 
(Graduanda de Psicologia / Univasf)

A escola para todos numa sociedade de classes como a nossa, que “pretende” ser democrática provendo acesso aos estudantes não importando suas origens, é uma ideia de escola liberal com intenção de atingir e educar o maior número de pessoas. Sendo assim, o entendimento que se tem é de que a educação chega para todos e, dessa forma, os estudantes que irão adquirir conhecimento e serão bem-sucedidos serão aqueles que, providos de inteligência e força de vontade, aproveitarão os conhecimentos transmitidos pela escola e oportunizados pelo Estado.
 Essa ideia não é totalmente falsa, mas números apontam que grande parte dos estudantes matriculados em nossas escolas não conseguem acompanhar o processo de aprendizagem e que muitos abandonam os estudos ainda nos anos iniciais.
Bourdieu, através de sua análise sociológica, critica essa promessa da escola que não se realiza na prática. Ele aponta a escola como uma instituição de reprodução social pela qual as crianças adquirem determinados conhecimentos que são valiosos para a sociedade. Mas ele questiona o porquê nem todas as crianças avançam nesses conhecimentos. Por que os currículos escolares são formados por esses conhecimentos e não outros? E por que nem todas as crianças se apropriam deles?
Segundo o sociólogo, a chave para entender esse fenômeno está no que ele chama de capital cultural (o conhecimento e o saber), o capital social (contatos e bons relacionamentos) e o capital simbólico (imagens associadas a beleza, ao status ou a fama). Estes capitais que não são os econômicos de Karl Marx, têm seus efeitos nas relações sociais que não são dadas só pela posse de dinheiro. Uma série de construções e de legitimidades não são obtidas apenas pelo poder econômico de uma pessoa. Há outras coisas que podem trazer importância e legitimidade no meio escolar. Não são quaisquer conhecimentos. São os socialmente valorizados. É a cultura que determinados grupos entram em contato e reconhecem uma importância, um valor nela.
A escola vai produzir o quê se ela pretender transmitir a cultura da sociedade dominante? Uma herança cultural? Sim, aquilo que é mais valioso e legítimo para as classes dominantes. Isso que a escola reproduz é exatamente o capital cultural que apenas uma pequena parcela dos estudantes tem condições de adquirir em sua socialização primária e já leva como bagagem pessoal para as escolas. Lá esses estudantes encontram um ambiente natural e já dentro do contexto que vivenciam fora da escola. É nesse sentido que a escola virá palco de reprodução de desigualdades, pois quem não leva para o convívio escolar esse capital cultural, social e simbólico não está em pé de igualdade com aqueles que já possuem este conhecimento prévio. Isso os leva a um violência simbólica que é uma espécie de desconforto, de coação que causa uma dor que não é física, mas sim social, psicológica e fruto da incompatibilidade do nível de capital cultural, social ou simbólico.
São as pessoas da camada dita dominante da sociedade que têm acesso a esses conhecimentos mais refinados em seu dia a dia pois exigem uma certa capacidade financeira. Essa relação é que constitui o capital cultural e social que é formado primeiramente pela família. Uma pessoa que é criada com acesso a quadros em casa, ouvindo músicas de qualidade, com acesso a jogos educativos, visitando museus, viajando, lendo bons livros e recebendo bons estímulos constantemente adquire uma bo bagagem cultural e social que irá ajudá-la por toda a sua vida escolar. São aqueles alunos que conseguem e destacar em sala de aula. Já a falta deste capital irá influenciar negativamente a pessoa por toda sua vida muitas vezes condenando um aluno a estar sempre num nível mediano ou até mesmo não conseguindo acompanhar o processo de aprendizagem. 
Em nossa realidade, muitas pessoas possuem muito pouco desse capital cultural e social e entram numa escola que não lhes parece nem um pouco familiar. Irão conviver num ambiente que transmite essa cultura legítima como natural para todas as pessoas, mas que para muitos não é de modo que não conseguem acompanhar o ritmo escolar.
Um outro conceito trazido por Bourdieu que nos faz compreender melhor as desigualdades vivenciadas dentro do ambiente escolar é o habitus, que é justamente a internalização de valores e princípios que acabam constituindo nosso estilo de vida e a nossa visão do mundo. Ele é fruto do intercambio do meio com as pessoas e vice-versa.  Dependendo da qualidade do habitus de uma criança, ela terá maiores ou menores dificuldades em sua vida escolar. 




Referências

                .“Aescolaconservadora:asdesigualdadesfrenteàescolaeàcultura”.In: Nogueira, Maria Alice; Catani, Afrânio (Org.).Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 2011a[1966].
                “Os três estados do capital cultural”.In: Nogueira, Maria Alice;Catani,
Afrânio (Org.). Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 2011b [1979].

Bourdieu, Pierre; Passeron, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Petrópolis: Vozes, 2008.
                               . Pierre Bourdieu: Sociologia. ORTIZ, Renato (org.). São Paulo: Ática,1983.
(1)EstudantedadisciplinaEducaçãoePolíticasPúblicas(2018.2),daênfasedeEducação,docursode PsicologiadaUnivasf(Prof.MarceloRibeiro).

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