quarta-feira, 16 de junho de 2021

Educação inclusiva na educação infantil: reflexões acerca das crianças com deficiência

                   


             

                                                                                                                                          Luana Paula Alves dos Santos

Graduanda em Psicologia

Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf)

luana.paula@discente.univasf.edu.br  



A educação infantil, enquanto espaço social deve, dentre outras coisas, oferecer condições plenas para o desenvolvimento da criança. Embora possa parecer óbvio, esse fato é considerado como um novo paradigma, tendo em vista que ao longo da história do país a escola não se constituiu como um espaço para toda a população. Nesse sentido, é novo também o movimento de inclusão escolar se for observado o tempo longo de exclusão de minorias, que são impedidas de ter acesso a oportunidades.

Para que haja uma educação inclusiva é necessário que exista uma organização no sistema educacional afim de garantir não somente o acesso, mas também a permanência e condições de aprendizagem a toda a população em idade escolar. A educação inclusiva pressupõe igualdade de oportunidades, a valorização das diferenças de modo a contemplar as diversidades étnicas, sociais, culturais, intelectuais, físicas, sensoriais e de gênero de todo ser humano. Ademais, a educação inclusiva possui cinco princípios, sendo eles: toda pessoa tem direito de acesso à educação, toda pessoa aprende, o processo de aprendizagem de cada pessoa é singular, o convívio no ambiente escolar beneficia a todos, e a educação inclusiva diz respeito a todos.

O nosso recorte aqui considera a inclusão escolar de crianças com deficiência, tendo em vista que estas, por vezes, são ainda mais marginalizadas e o acesso aos direitos fundamentais são negados. Justamente por possuírem características distintas se faz necessário que a escola adote ações diferenciadas. A história acerca da educação de pessoas com deficiência também é de total exclusão, tendo sido institucionalizadas e afastadas do convívio social, sendo separadas em escolas ou classes especiais, tendo sua participação em ambientes comuns condicionadas a um processo de normalização. Isso parece se agravar quando se tratada da educação infantil, que se sobrepõe a própria frágil condição da infância na história social do Brasil.

Essa lógica de exclusão se assemelha as práticas manicomiais na medida em que estigmatiza, esconde da sociedade o diferente, que é fora da norma padrão. Por outro lado, há discussões atuais que cada vez mais tem ganhado espaço, como é o caso da “medicalização da vida” e dos seus processos de padronização da vida humana e da aprendizagem, mesmo que, por outro lado, o momento atual de reflexões acerca da educação inclusiva esteja direcionada a garantias de direitos educacionais iguais e equidade educacional. 

As metas da escola e classe especial para educação da pessoa com deficiência que envolviam a normalização do sujeito para, então, ser integrado à escola comum, negam a condição de diferença e diversidade humana, além de estabelecer parâmetros homogêneos de desenvolvimento, quando na verdade isso não é possível de acontecer. Nesse sentido, a escola deixa de ser a instituição responsável por formar novas gerações e difundir conhecimentos, e passa a focar, na maioria das vezes, em modificar o aluno com deficiência através de reabilitação de funções ou habilitação para o desempenho de funções que não existem por conta da deficiência. Tudo isso vai de encontro aos princípios da educação inclusiva supracitados que valorizam a ideia de que todos são singulares e aprendem ao seu modo, prezando pelo respeito e pela convivência de todos em um mesmo ambiente.

Desse modo, se faz necessário que a escola esteja aberta para receber a diversidade, para acolhê-la, respeitá-la e valorizá-la como algo importante para que se tenha uma sociedade democrática e justa, cumprindo o seu papel social de atender a todos os alunos, incluindo os alunos com deficiência, desenvolvendo processos de ensino e aprendizagem que possibilitem condições de desenvolvimento acadêmico para que tenham condições de ter acesso a oportunidades iguais na vida e no mercado de trabalho. 

Para que haja uma mudança na sociedade acerca da forma como a mesma enxerga e lida com as pessoas com deficiência, minimizando estigmas e preconceitos, é necessário que se comece a trabalhar essas questões desde cedo com as crianças, e a escola se trata de um espaço propício para tal. A inclusão de crianças com e sem deficiência, convivendo e ocupando o mesmo espaço produz benefícios para ambos os lados, enquanto a criança com deficiência é incluída, aceita, sentindo-se acolhida na escola, melhorando, por exemplo, sua autoestima, sua relação com a aprendizagem, as crianças sem deficiência aprendem a conviver com o diferente, a respeitar, “naturalizando” todas as formas de existência. O brincar nesse contexto diverso proporciona ainda mais um bom desenvolvimento infantil, mas isso é uma outra boa discussão.

Nesse sentido, tais ações contribuem para que se minimize o que se entende por capacitismo, que se trata justamente da discriminação voltada a pessoas com deficiência, da leitura que se faz desses indivíduos, considerando que a condição corporal é algo que, por si só, as coloca em uma situação de menos capazes. O capacistismo internalizado desencadeia uma dificuldade social em interrogar-se pela diferença, fazendo com que se perceba as pessoas com deficiência como menos humanos. Ainda, se relaciona com uma compreensão normatizada e autoritária sobre o padrão corporal humano, que foi brevemente discutido aqui anteriormente, trazendo à tona a crença de que corpos que desviem da norma serão insuficientes.

O desconhecimento e a ausência de debates na população acerca dessas questões decorrem, por exemplo, do descumprimento da legislação que visa garantir o direito de participação de pessoas com deficiência na sociedade, como a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que trata, dentre outras coisas, da acessibilidade como direito fundamental. A acessibilidade se refere a seis dimensões, sendo elas: barreiras arquitetônicas (físicas); barreiras comunicacionais (acesso à informação); barreiras metodológicas (adequação de métodos e técnicas para o acesso de Pessoas com Deficiência à educação, cultura e lazer); barreiras instrumentais (adequação de ferramentas e utensílios); barreiras programáticas (políticas públicas); e barreiras atitudinais.

A luta das pessoas com deficiência pela garantia de direitos e acessibilidade, em diversas esferas, previstos por políticas públicas, por exemplo, é longa e ainda há muito o que percorrer. Garantir a efetivação e cumprimento de tais políticas e leis, desde cedo, a partir da educação infantil, é um bom ponto de partida; para que sejam construídas relações e oportunidades com equidade, visando desenvolver todo o potencial possível das crianças com deficiência, levando em consideração as suas características singulares.

 

 

Este texto é produto do processo vivido no âmbito da disciplina Educação e Políticas Públicas Inclusivas, do curso de Psicologia, da Univasf, tendo como prof. Marcelo Silva de Souza Ribeiro.


Para saber mais

 

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Dispõe sobre a inclusão da pessoa com deficiência. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 09.  jun. 2021.

 

CARNEIRO, Relma Urel Carbone. Educação inclusiva na educação infantil. Práxis Educacional, v. 8, n. 12, p. 81-95, 2012. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/124965>.

 

INSTITUTO RODRIGO MENDES. Diversa educação inclusiva na prática, 2021. Plataforma de compartilhamento de conhecimento e experiências sobre inclusão de estudantes com deficiência, transtorno do espectro autista (TEA) e altas habilidades/superdotação na escola comum. É voltada a educadores, gestores escolares e públicos, familiares e outros profissionais interessados em educação inclusiva. Disponível em: https://diversa.org.br/. Acesso em: 08 jun. 2021.

 

VENDRAMIN, Carla. Repensando mitos contemporâneos: o capacitismo. Portal PubliOnline, Campinas, ISSN: 2675-6137, ago. 2019. Disponível em: https://www.publionline.iar.unicamp.br/index.php/simpac/article/view/4389/4393. Acesso em: 09 jun. 2021.

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