domingo, 28 de março de 2010

A CULTURA INDIVIDUALISTA DA UNIVERSIDADE

Muitos acreditam (e vários já falarem para mim) que a universidade é um ambiente muito especial, sobretudo para trabalhar. Especificamente, as pessoas dizem e acreditam nisso porque associam com o grau de conhecimento no ambiente universitário, com a quantidade de informações circulantes e com o tempo de estudo dos professores. Tudo isso faz crer às pessoas externas a universidade, que essa instituição deve ser o lugar mais maravilhoso para se trabalhar, pois lá reinaria a compreensão, o diálogo, o respeito e a cooperação entre os colegas. A crença iluminista parece que se concretiza nesse tipo de suposição, uma vez que a luz do conhecimento e da ascensão racional, via os estudos, elevaria o ser humano (professor) a níveis elevados da convivência. Ledo engano para a pobre pessoa que, na sua ingenuidade, se decepciona no primeiro contato com o ambiente universitário. Costumo dizer que nós, professores, temos que ter muito cuidado e sermos atentos para não sucumbirmos em um dos pecados capitais, a vaidade. A universidade, a academia como é assim chamada, é um ambiente propício para exercitação do ego, onde se insufla o eu deixando tão cheio de si que se é incapaz de estabelecer relações de troca e de reconhecimento do outro. O narcisismo é algo facilmente eliciador ao professor. Caso ele não esteja atento, facilmente sucumbe as sedutoras e traiçoeiras tranças de suas medusas refletidas nos espelhos. O conhecimento, tão bem mitologicamente abordado na bíblia, revela a queda do ser humano. Isto significa que o professor, que convive tanto com o conhecimento, que está muito perto do poder-saber, que lida diariamente com o suposto saber e com a autoridade daí delegada pelo outro, corre o risco de se perder em si mesmo e se achar petulante, arrogante, auto-suficiente, avesso às críticas, com medo de errar, com dificuldade de confrontar suas idéias, de estabelecer relações dialógicas e exercitar a humildade da ignorância (um dos princípios da própria ciência). Além disso, quero destacar a enorme dificuldade daí decorrente, que é a dificuldade do professor lidar com o coletivo. Normalmente, quando embebido de si mesmo, o professor se preocupa de maneira demasiada apenas com o seu projeto, com a sua disciplina, com o seu laboratório, com a sua abordagem, com o seu gueto, com o seu canto, com o seu grande-eu. Não haveria problema, reflito, se o professor se preocupasse com os “seus”, mas desde que pudesse fazer um contraponto com uma visão mais ampliada, mais coletiva dos interesses e necessidades da universidade. No dizer de Zabalza (2004) e Kourganoff (1990), a cultura universitária é muito mais individualista do que se supõe. Lidar com essa cultura tem sido um dos meus maiores desafios na pro-reitoria de ensino. Sinto que muito há o que ser feito para continuar a desenvolver uma contracultura onde o educador seja educado, mas parafraseando Marx, como e quem será aquele capaz de educar o educador?
07 de junho de 2009. Em vôo – entre Petrolina e Goiânia.

KOURGANOFF, Wladimir. A face oculta da universidade. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1990.
ZABALZA, Miguel A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed, 2004.

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