Marilúcia Vasconcelos[1]
Ao
longo do tempo, estudiosos e pesquisadores da educação brasileira tem
intensificado suas reflexões e debates em torno da elaboração do Projeto
Pedagógico Institucional (PPI). Provocadamente, tal intenso foi outorgado a
partir da promulgação da Lei n° 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LBB), ao dispor em seu Art. 12, inciso I, a incumbência dos
estabelecimentos de ensino em elaborar e executar sua proposta pedagógica. Ademais,
a mesma lei em seu artigo 14 prescreve sobre a gestão democrática da escola enfatizando
a participação dos profissionais de educação na elaboração do projeto
pedagógico da escola, em consonância com suas peculiaridades locais, ao tempo
em, que assegura as unidades escolares, em seu Art. 15, graus de autonomia
pedagógica, administrativa e de gestão financeira.
Parece
indiscutível, ao apropriarmos de algumas premissas expressas nos artigos
supracitados à evidência imperiosa que a lei provoca aos estabelecimentos de
ensino, para um processo de aprendizagem ao exercício da autonomia e emancipação.
Por sua vez, reforça o entendimento racional de os processos comunicativos instaurados
na práxis são condições imprescindíveis às reflexões e debates para definição
consensual quanto ao projeto pedagógico, como instrumento norteador das ações
educativas. O que denota que é nas práticas interativas que emerge a efetiva autonomia
e emancipação da escola. Assim, parece interessante reativar o princípio
epistemológico do projeto pedagógico institucional à luz da racionalidade, na
concepção de Veiga ao afirmar que:
Relacionando
essa discussão à organização da prática pedagógica, é preciso atentar para o
universo epistemológico no qual o
trabalho escolar esta baseado, colocando em destaque as orientações éticas do
trabalho que produz. São essas orientações éticas que caracterizam os sujeitos
do projeto politico pedagógico como
sujeitos de uma ética, que pode ser orientada para uma racionalidade
instrumental ou emancipatória. (Veiga, 2008, p.227).
Todavia,
factualmente, quando se discutem o processo de sistematização da organização do
trabalho pedagógico institucional, a serem explicitas no documento PPI, as
discussões ainda recaem na sobreposição dos princípios da eficiência e
produtividade. O que consequentemente, consubstancia um caráter eminentemente instrumental
da proposta, como planejamento centralizador prevalecente de uma
burocratização, onde a primazia fica instituída e assegurada no bojo de um
documento técnico-burocrático mais em cumprimento as exigências
e determinações advindas das políticas públicas e dos órgãos normativos da
educação do que como adutora à efetivação da identidade própria
escolar e, consequentemente, sua autonomia.
No
palco dessa episteme, tomo empréstimo
os postulados de Prestes que em sua obra
Educação e Racionalidade corrobora com o pensamento do teórico Jürgen Habermas
à luz da sua Teoria da Ação Comunicativa, para elucidação do tema, ao criticar
a sociedade moderna que acentuada por uma administração centralizada na
racionalidade técnico-instrumental, vem consequentemente gerando um
esvaziamento do real significado social, ético-político e pedagógico da
educação, uma vez que a racionalidade instrumental é determinada pela conjunção
binária dos meios/fins. A rigor, exemplificamos aqui, a onipresente racionalidade
instrumental expressa na escola quando aduz a mesma na transformação de sua
função maior, a do ensino-aprendizagem, em resultados mensuráveis guiada pelos
padrões e metas previamente estabelecidos como indicadores de desempenho.
A constatação factual de uma razão instrumental, dominante nas sociedades modernas, é
indispensável para compreender como não se realizam mais as condições objetivas necessárias à formação do
sujeito, o que gera
problemas para o fundamento normativo da educação. Esse aspecto é analisado
pela crítica da razão. (Prestes, 1996, p.13).
Isso
reforça uma necessária mudança paradigmática na escola, ou seja, uma
transversalidade da razão instrumental para a razão comunicativa. O que inclui
um repensar sobre o papel da educação na contemporaneidade, a partir de um
processo de ressignificação da práxis social voltada para a emancipação dos
sujeitos. Portanto, essa superação da razão instrumental pela razão comunicativa deve
partir dos sujeitos para os sujeitos e sua relação com o “mundo da vida”, ou melhor,
a subjetividade vai
dando lugar a uma intersubjetividade na regulação dos saberes e normas que
concilia, regula e materializa a ação pedagógica. Nesse deslocamento, Habermas
infere que “desaparece a separação
ontológica entre o eu transcendental e o eu empírico” (Prestes, 1996, p.91).
Então,
conclui-se que ao elucidar sobre a razão comunicativa, Habermas refere-se à “interação de ao menos dois
sujeitos capazes de linguagem e ação, que estabelecem uma relação
interpessoal”, nos incita a compreender a razão não mais como resultado
da subjetividade, mas como efeito da intersubjetividade que centrada nas
intensificadas comunicações se convertem em consensos e, por decorrência na
legitimação das pretensões. Pois, é no exercício dialógico sobre a complexidade
do mundo vivido que a transversalidade da razão instrumental para a razão
comunicativa vai possibilitando à escola uma efetivação da autonomia como
condição à emancipação e democratização.
Não há como esgotar
um tema de tão grande relevância para a educação como projeto pedagógico
institucional como instrumento privilegiado para as interações numa perspectiva
da Teoria da Ação Comunicativa de Habermas, mas é possível iniciar e
intensificar os estudos sobre o ato educativo como processo político-social a
partir da razão comunicativa, numa perspectiva de autonomia e emancipação que
supere o atual modelo de educação vigente. Isto faz deste ensaio uma intensão a
não encerramos aqui essas reflexões, mas na adoção de uma racionalidade de que
novas reflexões deverão ressurgir.
[1]
Pedagoga, especialista em programação do ensino em
pedagogia e Assessora Pedagógica da Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
de Petrolina - FACAPE.
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